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Pesquisa verifica percepção de jovens sobre componentes de sustentabilidade

por Mauro Bellesa - publicado 18/04/2017 10:47 - última modificação 18/04/2017 10:47

No seminário Uso de Métodos Geográficos para Caracterização de Desigualdades Sociais, realizado no dia 29 de março, pesquisadores de universidade britânicas apresentaram pesquisas realizadas no Vale do Paraíba (SP), Litoral Norte de São Paulo e na Índia.
Seminário Use of Geographic Methods to Characterize Social Inequalities - 29/03/2017
Participantes britânicos e brasileiros do seminário Uso de Métodos Geográfico para a Caracterização de Desigualdades Sociais

Um novo conceito para a análise das condições de sustentabilidade de áreas urbanas e rurais tem sido utilizado por pesquisadores nos últimos anos. Trata-se do exame do "nexo alimento-água-energia", que procura examinar as inter-relações desses três componentes essenciais para a qualidade ambiental e da vida humana.

O IEA passou a discutir esse tema no ano passado, quando ocorreu o seminário A Governabilidade do Nexo Urbano. O assunto foi retomado este ano em evento público no dia 29 de março, com o seminário Uso de Métodos Geográfico para a Caracterização de Desigualdades Sociais.

O seminário foi organizado em parceria com o Instituto de Estudos Avançados da Universidade de Birmingham (UoB), do Reino Unido. Os dois IEAs integram a rede Institutos de Estudos Avançados Baseados em Universidades (Ubias, na sigla em inglês) e têm realizado várias atividades em conjunto nos últimos anos.

Participaram como expositores pesquisadores da UoB e das também britânicas Universidade de Leicester e Universidade de Northampton. A comentarista foi Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora do Grupo de Estudos de Agricultura Urbana do IEA A coordenação do encontro foi de Ligia Vizeu Barrozo, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas  da USP e coordenadora do Grupo de Estudos Espaço Urbano e Saúde do IEA.

O primeiro painel do encontro tratou da pesquisa "(Re)Conexão do Nexo: Experiências de Jovens Brasileiros no Aprendizado sobre Alimento, Água e Energia", desenvolvida por pesquisadores das três universidades britânicas e da Unesp.

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A pesquisa está em andamento e tem por objetivo analisar as experiências de jovens (10 a 24 anos) do Vale do Paraíba e do Litoral Norte do Estado de São Paulo com questões relativas a alimentos, recursos hídricos e fontes energéticas, além de verificar o que eles sabem sobre a relação entre esses três fatores.

Peter Kraftl - 29/03/2017
Peter Kraftl

O coordenador do projeto, Peter Kraftl, da UoB, falou sobre os objetivos e metodologia da pesquisa, o conceito de nexo alimento-água-energia e os questionamentos a essa abordagem. Segundo ele, a ideia de nexo tem sido defendida basicamente por pesquisadores e formuladores de políticas dos EUA e do Reino Unido.  "Uma das questões que queremos avaliar é se essa ideia é relevante para o Brasil".

Embora o pensamento baseado no nexo possa ser útil para grupos formuladores de política, "ele implica na criação de conexões e exame dos trade-offs [relações em que o ganho em algo significa perda em outro] que acabam desembocando num holismo imposto, reduzindo processos sociais e materiais complexos a simples componentes do nexo, como alimento e água", comentou Kraftl. Em sua opinião, muitas pesquisas ignoram a realidade de vida de indivíduos e comunidades e como se engajam no nexo.

Ele disse que um dos problemas principais para formulação de políticas públicas a partir da análise do nexo é conseguir minimizar ao máximo o trade-off, como no dilema entre plantar para produzir alimentos ou biocombustíveis. Kraftl perguntou: "Quem toma essas decisões? Como elas são tomadas? Quais as vantagens e desvantagens de cada opção?"

Todavia, ele considera que o exame de como jovens e formuladores de políticas públicas veem o entrelaçamento dos componentes do nexo influencia a vida e trabalho das pessoas pode favorecer a educação sobre sustentabilidade.

Além de Kraftl, também fizeram exposições sobre a pesquisa Catherine Walker, da Universidade de Leicester, que tratou das entrevistas feitas com lideranças e profissionais, e Cristiana Zara, da UoB, que falou sobre as entrevistas feitas com os jovens do Vale do Paraíba.

Em março tiveram início as entrevistas de referência detalhadas com 5 mil jovens da região. No mesmo período começaram a ser feitas as entrevistas qualitativas com 50 jovens. Um aplicativo para celular tem sido fornecido aos entrevistados para que registrem suas experiências diárias em relação a alimentos, água e energia.

Até junho, também serão entrevistados 50 pessoas envolvidas com a formulação de políticas, incluindo educadores e representantes do setor privado e do órgãos governamentais.

O projeto também está realizando um concurso de vídeo. Dez vídeos ficarão online no YouTube para que jovens de todo o mundo votem nos seus preferidos.

Catherine disse que objetivo de realizar entrevistas com lideranças e profissionais é útil para entender o contexto em que os jovens estão crescendo, o acesso que eles têm aos recursos, as restrições a esse acesso e o que eles sabem sobre recursos naturais.

Um dos pontos destacados nessas entrevistas, segundo ela, é a questão do êxodo rural. "Os jovens não encontram oportunidades de desenvolvimento e educação no campo e são atraídos pelas cidades por diversos fatores. Isso é preocupante, uma vez que já há grandes concentrações de pessoas em cidades do Vale do Paraíba. E à medida que pequenos produtores de alimentos se transferem para a cidade, a terra acaba sendo ocupada pela agricultura intensiva, que demanda mais água."

A segurança em relação à água também tem aparecido com destaque nas entrevistas, com muitas referências à crise hídrica de 2014/2015. "Vários entrevistados destacaram que as pessoas tem consciência sobre a importância dos recursos quando eles se tornam escassos, mas acabam voltando aos hábitos de consumo anteriores à crise quando o fornecimento se normaliza."

Cristiana, por sua vez, destacou que nas entrevistas que estão sendo feitas com os 5 mil jovens revelam o forte envolvimento cultural deles com a comida, com grande apreço pelo papel da comida no favorecimento da sociabilidade.

No caso da água, ela disse que está havendo uma expansão dos conceitos sobre os variados usos do recurso (alimentação, saneamento, agricultura, produção de energia e uso industrial), com a incorporação do tema na educação para a sustentabilidade, "apesar de isso não se dar maneira uniforma no sistema educacional".

Segundo Cristiane, os jovens demonstram um forte sentimento de responsabilidade individual pelo uso adequado dos recursos naturais. "Para muitos, se cada um fizer sua pequena parte,  isso irá encorajar práticas sustentáveis na comunidade. Ao mesmo tempo há um forte senso da dimensão política da questão, com a demanda de que o Estado também faça sua parte."

O projeto liderado por Kraftl é financiado pelo Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Apoio à Pesquisa (via Fapesp) e por duas instituições britânicas: o Conselho de Pesquisa Econômica e Social (ESRC, na sigla em inglês) do Reino Unido e o Fundo Newton.

Sophie Hadfield-Hill - 29/03/2017
Sophie Hadfield-Hill

Urbanismo na Índia

A segunda parte do evento também tratou indiretamente de aspectos relacionados ao nexo, porém no contexto específico do crescimento urbano indiano. O tema foi o projeto "Novo Urbanismo na Índia: Vida Urbana, Sustentabilidade e Vida Cotidiana". A expositora foi Sophie Hadfield-Hill, da UoB, coordenadora do projeto, também apoiado pelo ESRC.

Segundo ela, 590 milhões de indianos estarão vivendo em cidades em 2030, com 91 milhões de famílias de classe média e 61 cidades com mais de 1 milhão de habitantes. "Será necessário o investimento de US$ 1,2 trilhão paras as demandas desse crescimento urbano."

Sophie falou sobre os novos empreendimentos habitacionais em construção na periferia das cidades indianas e sobre as ameaças às áreas urbanas. "Há a pressão do crescimento e da migração da população sobre os serviços urbanos, sobre o acesso a saneamento, água e energia, além dos impactos sobre a terra e demais consequências da desigualdade social."

Os principais desafios são o fornecimento de água de qualidade, coleta de esgoto e fornecimento de energia elétrica. "De acordo com o Banco Mundial, apenas 16% das casas tem coleta de esgoto. Nenhuma cidade indiana tem fornecimento de água 24 horas por dia e apenas 1/4 da população tem acesso à eletricidade".

Apesar de todas essas dificuldades para a vida urbana na Índia, o primeiro ministro Narendra Modi, ao assumir o governo em maio de 2014, propôs a criação de 100 cidades inteligentes, com a adaptação de cidade existentes e construção de cidades inteiramente novas, comentou Sophie A proposta recebeu várias críticas, segundo ela, mas 20 cidades já foram escolhidas por meio de concurso nacional.

O governo indiano define cidades inteligentes como aquelas que "se preocupam em primeiro lugar com suas necessidades mais urgentes e nas melhores oportunidades para a melhoria da qualidade de vida". Elas devem utilizar um elenco de abordagens que inclui "tecnologias digitais e de informação, melhores práticas de planejamento urbano, parecerias público-privadas, mudança políticas e colocar as pessoas em primeiro lugar", comentou Sophie.

Entre outras iniciativas, as propostas para a cidades inteligentes indianas preveem pavimentação que capture a energia do movimento dos automóveis, sistemas online das conexões de água e pontos de ônibus inteligentes.

Como caso de estudo ela falou sobre a construção da cidade de Lavasa por um empreendimento privado. Ela terá cinco polos (o primeiro já está pronto), abrigarão 300 mil habitantes e poderá receber 2 milhões de turistas por ano.

Segundo Sophie, Lavasa está sendo construída segundo os princípios do novo urbanismo. Alguns deles são: sustentabilidade; crescimento planejado de densidade (população diminui à medida que as habitações se distanciam do centro); mistura de tipos de moradia, inclusive de grupos de renda; facilidade de acesso a serviços em geral (10 minutos de caminhada a partir de casa ou do trabalho à maioria deles); qualidade arquitetônica e de design urbano.

Fotos: Marcos Santos/Jornal da USP