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Como um instituto de tecnologia pode mudar os rumos da conservação ambiental na Amazônia

por Beatriz Herminio - publicado 14/07/2022 16:55 - última modificação 18/07/2022 16:43

Pesquisadores apresentaram um projeto para criação do Instituto de Tecnologia da Amazônia (AmIT)

O potencial que a biodiversidade amazônica apresenta para a economia e como ela pode ser explorada de forma sustentável e com justiça social foi avaliado no pré-estudo de viabilidade para a criação de um Instituto de Tecnologia da Amazônia (AmIT).

O projeto foi apresentado em evento do IEA no dia 13 de julho e faz parte do programa Terceira Via Amazônica - Amazônia 4.0, sediado no instituto e financiado pelo Arapyaú, uma instituição privada sem fins lucrativos que direciona recursos financeiros para iniciativas que trabalham pelo desenvolvimento sustentável.

Carlos Nobre - 13/07/2022
Meteorologista Carlos Nobre coordenou o evento
"Não existe nenhum país tropical que desenvolveu uma bioeconomia baseada nos seus recursos naturais, nas suas florestas e na sua biodiversidade", disse Carlos Nobre, pesquisador colaborador do IEA e que lidera o Amazônia 4.0. Ao avaliar a oportunidade que tem o Brasil, ele afirma que além de apontar os riscos das mudanças climáticas para a Amazônia, é preciso buscar soluções.

O Amazônia 4.0 investiga o caminho dessas soluções a partir de três iniciativas: o trabalho de campo com laboratórios criativos na Amazônia, a Amazonia Rainforest Business School e a criação de um instituto "como o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT)" para a Amazônia: o AmIT.

Um instituto de tecnologia da Amazônia

O objetivo do projeto é transformar o conjunto de informações disponíveis em ações práticas que possibilitem a conservação ambiental, a inclusão social e a geração de renda. É antes de tudo uma chamada para uma cooperação nacional, afirmou Adalberto Luis Val, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI).

A AmIT será uma instituição público-privada de alcance Pan-Amazônico. Com características supranacionais, o projeto está envolvido com as agendas globais e alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Sua estratégia de atuação passa por uma coalizão de redes criativas entre empresas, academia e governos para consolidar saberes regionais, produzir e transformar informações robustas e adequá-las às especificidades da diversidade amazônica.

A Pan-Amazônia possui hoje uma população estimada em 50 milhões de pessoas que devem ser incluídas nos estudos. "Não encontramos incompatibilidade entre o conhecimento tradicional dos povos originários da Amazônia e o conhecimento científico", disse Val.

O projeto

Entre os desafios do AmIT estão a sociobiodiversidade, a geopolítica regional, o uso do conhecimento e do volume de informações disponíveis, a decodificação da informação, a inclusão social e a geração de renda.

Adalberto Luis Val - 13/07/2022
Adalberto Luis Val: ''Quando deixamos que a ciência e tecnologia da Amazônia sejam desenvolvidas fora da Amazônia, na verdade estamos rifando o território amazônico''
O instituto pretende ser uma referência mundial em educação, ciência, tecnologia e inovação. Seu intuito é promover de forma efetiva a economia sustentável e socialmente inclusiva, permitindo a conservação ambiental por meio do uso da informação contida na floresta amazônica.

Como missão, Val apontou o desenvolvimento socioeconômico e a melhoria da qualidade de vida da população amazônica. Isso se dará por meio da transformação do conhecimento científico e tradicional em inovação tecnológica a serviço da Amazônia e do mundo.

"Em função das experiências que temos até aqui, não é possível importar soluções para a Amazônia. Precisamos pensar como fazer, seguindo as características da região."

O instituto contempla a criação de cinco Centros de Desenvolvimento e Estudo dedicados às questões prioritárias para a região: Águas da Amazônia, Floresta, Paisagens alteradas, Amazônia urbana e Mineração inteligente. Os centros serão permeados por nove componentes estruturantes e seus desafios.

Os componentes seguem as metodologias de pensamento orientadas à solução de problemas, a partir de uma visão crítica e criativa. Os componentes são:

  • Saúde Integral e Medicina Tropical

  • Economias e materiais sustentáveis

  • Manufatura distribuída

  • Tecnologia para paisagens alteradas

  • Modelos educacionais

  • Recrutamento de pessoal

  • Outreach

  • Negócios e economia suportada por CTI

  • Direitos do bioma amazônico

O rio Amazonas deve ser usado como "artéria de desenvolvimento regional". Com laboratórios flutuantes que circulam em seu curso, pesquisadores irão levar para a bancada os problemas e demandas da região, propondo soluções. Os desenvolvedores pensaram em cinco laboratórios que fariam interlocução com as comunidades ribeirinhas.

Três linhas de negócio foram pensadas para o instituto. No âmbito da geração de projetos, o objetivo é identificar oportunidades e orientar o desenvolvimento de pesquisa e obtenção de patentes. Além disso, buscar financiamento de fundações internacionais junto a equipes especializadas. Na consultoria, o instituto oferecerá soluções inovadoras e pacotes tecnológicos aos segmentos socioeconômicos dos países amazônicos. Também implantará uma plataforma digital aberta de apoio a bionegócios.

Já no campo da educação, planeja-se um conjunto de programas de treinamentos técnicos, desde a graduação até o nível de pós-doutorado. Alguns exemplos de programas são: tecnologias avançadas para Amazônia, desenvolvimento para a Amazônia, sustentabilidade para o bioma amazônico, serviços ambientais amazônicos e ciências biológicas aplicadas para o desenvolvimento da Amazônia.

O intuito é receber estudantes que busquem visitar a região e que possam usar as bases flutuantes e as unidades de inteligência instaladas ali. Segundo Val, pretende-se criar uma rede com a participação de todas as instituições que trabalham com o tema nacional e internacionalmente.

Começando em 2023, espera-se que em 10 anos se tenha os primeiros resultados para inclusão social e geração de renda a partir do projeto.

"Quando deixamos que a ciência e tecnologia da Amazônia sejam desenvolvidas fora da Amazônia, na verdade estamos rifando o território amazônico, porque não temos acesso a isso." Val ressaltou que não há, em nenhum país amazônico, um banco de dados sobre a região. "Hoje, se a gente quiser saber sobre águas na Amazônia, precisa consultar o instituto Max-Planck, da Alemanha", concluiu.

"Nossa perspectiva é também uma perspectiva global." Para John Fernández, do Environmental Solutions Initiative do MIT, o trabalho a ser feito na Amazônia não será apenas relevante para o futuro da região. Também será importante para as florestas tropicais e para os hotspots de biodiversidade mundiais, em particular no Congo e no sudeste asiático.

Uma organização como a AmIT deve ser apenas a primeira de muitas, posicionando as universidades de pesquisa em direção a um futuro positivo para o antropoceno, acredita Fernández.

Para os próximos meses, Maritta Koch-Weser expressou o desejo de que ocorram consultas científicas a todas as instituições acadêmicas, de ensino e de pesquisa, trazendo temas concretos para o esquema apresentado.

"Eu acho que sempre existe esse perigo, quando se cria sistemas novos, de ficar muito tempo somente no planejamento", afirmou. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Amazônia em Transformação: História e Perspectivas, onde nasceu a ideia do Amazônia 4.0, ela enxerga a necessidade de combinar as projeções de médio e longo prazo da instituição com o desenho de um programa operacional programático que pode começar a fazer diferença a partir do próximo ano.

"O envolvimento da USP, em particular do IEA, com o tema da Amazônia vem de muito tempo", disse o diretor do IEA, Guilherme Ary Plonski. Ele citou a atenção de José Goldemberg às questões da Amazônia em 1989, quando era reitor. Na época, criou-se o Projeto Floram, um plano de reflorestamento do Brasil que tem seus resultados registrados na revista Estudos Avançados 4.

Também participaram do evento Paulo Nussenzveig, pró-reitor de Pesquisa e Inovação da USP, e Renata Piazzon, da Fundação Arapyaú.