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As consequências do agravamento do desemprego no Brasil

por Mauro Bellesa - publicado 23/10/2015 14:30 - última modificação 26/10/2015 14:03

Debate realizado pela revista "Estudos Avançados" no dia 16 de outubro sobre desemprego no Brasil contou com a participação de quatros colaboradores do dossiê sobre o tema que saíra na próxima edição do periódico.
Participantes do debate Desemprego no Brasil
Participantes do debate Desemprego no Brasil,
organizado pela revista "Estudos Avançados"

O aumento do desemprego, que subiu de 9,8% em janeiro para 13,5% em agosto nas regiões metropolitanas, talvez seja a face mais dramática da recessão econômica brasileira.

Para discutir as características da atual crise de emprego, suas relações com o quadro geral macroeconômico e as perspectivas de evolução do problema, a revista "Estudos Avançados" realizou no dia 19 de outubro o debate Desemprego no Brasil, tema do dossiê que a publicação trará na sua próxima edição, a ser lançada no início de dezembro.

Para o debate, foram convidados quatro especialistas: três colaboradores do dossiê – Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo e integrante do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit) do Instituto de Economia da Unicamp; Anselmo Luís dos Santos, do Cesit-IE-Unicamp; José Dari Krein, diretor do Cesit-IE-Unicamp –, mais Lúcia dos Santos Garcia, coordenadora nacional da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). A moderação foi do editor da revista, Alfredo Bosi.

Destruição de vagas

Segundo Lúcia dos Santos Garcia, o aumento do desemprego no 1º semestre de 2015, num período em que a força de trabalho manteve-se estável, deveu-se a um processo de destruição de postos de trabalho, "situação diversa daquela da década de 90, quando havia uma oscilação bastante tímida da ocupação, somada a uma pressão sobre o mercado de trabalho que vinha do avanço demográfico".

Lúcia dos Santos Garcia
Lúcia dos Santos Garcia

Ela afirmou que houve perda também na qualidade dos postos de trabalho, com a queda das contratações com carteira assinada acompanhando a redução dos vínculos sem carteira assinada. Acrescentou que, proporcionalmente, a queda no número de postos de trabalho está sendo maior no emprego público do que no emprego privado, devido a restrições a concursos, antecipação de aposentadorias, redução das contratações de celetistas e outros fatores.

Está ocorrendo também um aumento da insegurança entre os trabalhadores em razão do aumento da proporção dos desempregados entre os trabalhadores com mais tempo no posto do trabalho, levando a uma redução da permanência média dos trabalhadores no emprego, explicou Lúcia.

Ela disse que, no entanto, não é possível explicar completamente o que ocorre a partir das estatísticas do mercado de trabalho. “A situação atual pode ser mitigada por medidas do Ministério do Trabalho e outras iniciativas no âmbito do trabalho, como políticas protetivas, mas a solução tem de vir do mercado de produtos.”

Lúcia comentou que nos países centrais europeus a média de desemprego é de 11% atualmente, "um parâmetro importante para analisarmos a situação brasileira". Ela explicou que no Brasil, pelo critério mais restrito do que seja desemprego adotado na pesquisa de âmbito nacional do IBGE, a taxa passou de 6,3% no segundo trimestre de 2014 para 8,3% em igual período de 2015, mas que quando se considera um conceito mais abrangente de desemprego, incluindo todas as suas formas, como o observado na PED do Dieese, que contempla apenas as regiões metropolitanas, a taxa passou de 9,8% em janeiro para 13,5% em agosto.

Lúcia ressaltou que o desemprego afeta mais as mulheres, negros e jovens: "Mesmo que esses segmentos tenham menor participação no mercado de trabalho, eles tem grande expressão no contingente dos desempregados; qualquer política que desconsiderar isso é extremamente limitada".

Márcio Porchmann, por sua vez, destacou que no capitalismo "sempre há desemprego e que o pleno emprego, apesar de possível, é quase uma exceção à regra". Ele disse que o pleno emprego é algo que se verificou principalmente nos “30 gloriosos” (1945-1975) por ações especiais, sobretudo nos países ricos, e em função de iniciativas como a ampliação do emprego no setor público.

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"O Estado empregava de 3 a 4% da mão-de-obra até meados do século 20, mas depois da Segunda Guerra Mundial passou a responder por 15, 20, 25 e até 30% da força de trabalho; nos Estados Unidos, corresponde a 15% (sem contar os militares) e nos países escandinavos chega a 1/3 da mão-de-obra."

Pochmann também citou que aconteceram várias ações para a retirada de pessoas do mercado de trabalho, como idosos, crianças, adolescentes e doentes, que até então não tinham outra alternativa de acesso a alguma renda. "A expansão do Estado de bem-estar social foi fundamental para essa retirada dessas pessoas do mercado de trabalho."

RAZÕES

Apesar de tudo isso, as duas últimas décadas do século 20 foram marcadas pela ascensão do desemprego, sobretudo nos países ricos, observou. Isso deveu-se a algumas razões fundamentais, segundo ele:

  • o desempenho das economias ricas não foi tão forte como tinha sido no pós-guerra e foi puxado não tanto pela indústria, mas pelo setor de serviços, que possui uma qualidade diferente de trabalho, com menor salário e menor jornada, com os trabalhadores muitas vezes tendo mais de um emprego;
  • as medidas que foram contraindo o gasto público e retirando a capacidade do Estado de contratar mão-de-obra (como as privatizações dos anos 80 e 90);
  • a redução de transferência de renda que possibilitava a certos segmentos viver na condição de desemprego por certo tempo;
  • o ingresso de 1,8 bilhão de pessoas que estavam foram do mercado de trabalho em função do fim da União Soviética e mudanças em economias como da China e Índia;
  • deslocamento da produção de vários países, sobretudo para a Ásia.

 

Márcio Pochmann
Márcio Pochmann

Ainda no plano internacional, Pochmann indica várias transformações, como a  desregulamentação e mudança no estatuto do trabalho, visando a flexibilizar o uso e reduzir o custo da mão-de-obra; a redução do emprego público, mencionada anteriormente por Lúcia; a onda de imigrantes da África e Oriente Médio procurando emprego na União Europeia, de mexicanos indo para os Estados Unidos e até mesmo de pessoas de vários países latino-americanos e africanos buscando oportunidades no Brasil.

Além disso, ele ressalta a presença cada vez mais frequente de novas formas de organização do uso do trabalho, graças às tecnologia de informação. "Um exemplo disso é o Uber e as caronas pagas, que devem desorganizar o trabalho dos taxistas, ou o aluguel de quartos, à margem da rede hoteleira, e o fornecimento de refeições pagas por famílias comuns."

Segundo Pochmann, o Brasil está sofrendo desde 2014 os efeitos da terceira onda da crise iniciada em 2008: "A segunda onde atingiu a União Europeia em 2011 e 2012; a terceira onda é essa que chega aos Brics".

ESGOTAMENTO

"A atual situação demonstra o esgotamento das políticas adotadas em 2008 e 2009 para tentar evitar que a crise de dimensão global se abatesse com mais força nos Brics; no caso do Brasil, trata-se do esgotamento da série de políticas que foram muito importante para evitar o desemprego, o aumento da pobreza e a desigualdade."

Mas o Brasil acabou adotando um mudança na orientação da política macroeconômica, que "de certa maneira foi contendo os mecanismos anticíclicos implantados de 2008 a 2014 e resultou numa recessão, que nos foi apresentada para durar um ou dois trimestres, mas já estamos no quarto trimestre de 2015 e a recessão não dá sinais de desaceleração, pelo contrário, e, infelizmente, os indicadores estão apontando um quadro ainda pior, o que pode fazer com que avancemos na recessão em 2106".

Diante dessas circunstâncias, Pochmann considera que dificilmente o desemprego será contido sem uma mudança drástica na orientação da política econômica brasileira.

Anselmo Luís dos Santos tratou principalmente do desemprego no contexto do panorama macroeconômico brasileiro. De acordo com ele, de 2004 a 2014, o país presenciou uma tendência de queda de desemprego que não se via desde os anos 70. "De 2003 a 2010, o Brasil teve crescimento médio de 4% sem um aumento na geração de emprego correspondente, e mesmo assim a taxa de desemprego caiu."

Além disso, o mercado de trabalho melhorou em termos de rendimento, de formalização, de queda da informalidade, de redução do trabalho infanto-juvenil e em relação a outros aspectos, acrescentou. "Melhorou até mesmo depois de 2012, quando a economia já começava a desacelerar e a taxa de crescimento já era muito baixa."

JOVENS

Para ele, o Brasil passa desde o início dos anos 2000 por um dos momentos mais positivos da transição demográfica, com influência no mercado de trabalho pelo lado da oferta de empregos: "A partir de 2005/2006, pela primeira vez na história do Brasil urbano e industrial começou a diminuir o número absoluto de jovens trabalhando". Isso foi fruto, segundo Santos, da melhoria dos empregos na família, aumento do salário mínimo e melhoria de renda em geral.

Do lado da oferta de força de trabalho, ele considera que país teve uma das maiores oportunidades de estruturar seu mercado de trabalho. Um ponto importante para isso, segundo ele, foram as políticas públicas, com a expansão das vagas em período integral nas escolas públicas crescendo muito e o aumento no número de vagas nas escolas públicas técnicas e de nível superior (nesse caso, nas escolas privadas também).

Anselmo Luís dos Santos
Anselmo Luís dos Santos

"Isso abre perspectivas melhores para os jovens. Mas mesmo a taxa de atividade dos jovens caiu, apesar de continuar muito elevada no Brasil, mais do que na Argentina, no Chile e no México."

No aspecto macroeconômico, Santos comentou que nos últimos 13 anos o país passou 11 ou 12 anos tendo a maior taxa de juros do mundo, "o que é uma política para destruir emprego, pois cria-se uma política para os rentistas, que dificulta investimentos e até mesmo o consumo e o crescimento".

"Ainda assim", destacou, "o desemprego caiu de forma impressionante e chegamos ao ano passado com uma taxa abaixo de 5%, além de quase pleno emprego (2%) para pessoas com 50 anos ou mais."

Santos comentou que as metodologias brasileiras tem padrão internacional, mas a estrutura do mercado de trabalho no Brasil não é igual à estrutura dos países desenvolvidos, pois o país tem mais informalidade e mais emprego doméstico, por exemplo: "Se calcularmos o número de desempregados em relação ao contingente de assalariados indicados pela PEA, veremos que a disponibilidade de pessoas para trabalhar como assalariados é muito maior".

Isso permite "dizer o contrário do que muitos economistas de tendência liberal vinham dizendo, de que tínhamos pleno emprego, argumento que eles usaram para dizer que isso estava levando a um aumento exagerado de salários, sendo necessário adotar uma política para conter esse crescimento, porque isso estaria associado à inflação".

Para ele, o mais lamentável nesse quadro "é saber que mesmo que o país tenha melhorado, a população de jovens que não trabalham e nem estudam ainda é muito grande, assim como a proporção de jovens que abandonam a escola para trabalhar ".

ELEVAÇÃO DOS JUROS

Para piorar a situação, segundo ele, "depois de março de 2013, há uma política de elevação dos juros que coloca as taxas brasileiras entre as maiores do mundo e a inflação, que estava num patamar de 7,5% não cai; até agora não houve nenhum sucesso da política monetária de elevar juros e reduzir a inflação, que está maior do que estava em 2003”.

De acordo com Santos, depois de ter provocado um crescimento brutal do endividamento público com a política de juros, o governo passa a discutir a questão fiscal, cujos problemas "não vem de um excesso de gasto ou de uma política fiscal anticíclica". O que vem pela frente, de acordo com ele, é uma mudança da política equivocada anterior, "que não conseguiu recuperar o investimento e baseou-se na desonerações de impostos".

"O país passou 12 anos crescendo, mas não fez uma reforma tributária, havendo isenções para vários segmentos. Além disso, ajuste fiscal se faz em período de crescimento, não durante numa crise."

Ele concorda com Lúcia na avaliação de que o crescimento rápido do desemprego não se deu por pressão demográfcia, mas pela destruição da vagas: "Um milhão de vagas foram destruídas em 12 meses" [de acordo com levantamento divulgado no dia 23 de outubro pelo Ministério do Trabalho, houve uma redução de 1,2 milhão de vagas de outubro de 2014 a setembro passado].

Sua avaliação é que a queda geral da renda fara aumentar o desemprego, "que também será alimentado pelo corte em políticas sociais, levando a maior desemprego entre os jovens, que passam a não ter acesso a escolas técnicas e ensino superior".

José Darin Klein
José Darin Klein

LEGISLAÇÃO

José Dari Krein discutiu a relação entre o desemprego com as propostas de alteração na proteção aos direitos trabalhistas. Em sua opinião, há uma relação direta entre a crise econômica e as propostas de flexibilização de direitos, "num contexto em que a onda conservadora busca se aproveitar da crise econômica, da crise do emprego e da crise política para tentar introduzir uma nova agenda na sociedade brasileira".

Segundo ele, estão sendo propostas alterações que representam retrocesso social, pois "ampliam a liberdade do empregador para estabelecer condições de contratação, uso e remuneração do trabalho. E isso visa a reduzir custos e colocar o trabalhador numa condição de insegurança social e em relação ao emprego".

Ele historiou que o desemprego dos anos 80 provocou reações na sociedade, com manifestações intensas. "A discussão era como atenuar a situação dos desempregados, com a instituição da cesta básica, transporte gratuito, seguro desemprego. Havia um enfrentamento do problema com uma perspectiva progressista."

De acordo com Klein, nos anos 90, o fenômeno do desemprego foi mais intenso, como resultado da opção do país em inserir-se no contexto da globalização, da forma como foi feita a estabilização da moeda e do contexto de transformação na forma da organização do trabalho.

Segundo ele," no governo de Fernando Henrique Cardoso, falava-se que só seria possível lidar com o desemprego e com a informalidade por meio de mudanças na legislação, considera muito rígida, e propunha-se a flexibilização do trabalho". Algumas medidas pontuais foram adotadas, mas não ocorreu uma reforma profunda e a tese da prevalência do negociado sobre o legislado, a mesma que é retomada agora, não foi aprovada, explicou.

Ele contesta essa tesa. Disse que nos anos 2000 houve uma queda sistemática do desemprego e uma elevação substantiva da formalização dos contratos de trabalho (até mais expressiva do que a capacidade de geração de empregos) e que isso aconteceu sem alterações na legislação trabalhista, "o que demonstra que a tese da flexibilização não era pertinente".

Nos anos 2000 também não presenciaram transformações substantivas na legislação do trabalho e da proteção social, "mas alterações pontuais, com algumas delas mais significativas, como a reforma da previdência, a regulamentação do estágio, política de valorização do salário mínimo".

TERCEIRIZAÇÃO

Segundo Klein, o projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que libera a terceirização não acrescenta nenhum direito adicional aos desempregados, mas coloca sob o risco de ficar terceirizado quem tem vínculo assalariado. "Todos os trabalhos mostram que há diferenças entre o assalariado direto e o terceirizado do ponto de vista da remuneração, jornada, benefícios, perspectiva profissional, proteção à saúde e  acidentes e garantia à organização coletiva".

Se vier a ser aprovada na forma proposta, essa liberalização "significa a destruição de um conjunto de proteções sociais, pois possibilita às empresas pressionadas por uma greve fazer um acordo e no dia seguinte demitir todo mundo e contratar uma terceirizada, com salários mais baixos e jornada maior", complementou Klein.

Ele criticou também as medidas do governo que impuseram restrições ao acesso ao seguro desemprego e à diminuição do abono salarial. "Todas as centrais sindicais condenaram essas medidas. Fraudes existem, mas deve ser combatidas por fiscalização."

Klein ainda comentou a proposta do Programa de Proteção do Emprego, em discussão no Congresso Nacional. Disse que um deputado pelo PMDB-RS introduziu no projeto a tese do negociado sobre o legislado, "uma nova ofensiva de construir um novo sistema de relações de trabalho mais flexível, que aumenta a desproteção dos trabalhadores".

Pela proposta, os sindicatos poderiam negociar a redução de direitos previstos em lei. "Se for aprovado, uma série de direitos podem virar pó num contexto de desemprego, quando há fragilização das entidades de negociação coletiva dos trabalhadores e os trabalhadores tendem a ter uma medida mais defensiva de proteção do emprego".

No entanto, ele considera que a medida, se aprovada, pode ter  pouco efetividade, "pois num contexto de aprofundamento da crise, a própria empresa terá dúvidas em ingressar no programa e ter que assumir o compromisso de manter os empregos".

Debate

A socióloga Helena Hirata, estabelecida na França, ex-professora visitante do IEA e atualmente professora visitante internacional do Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, pediu aos debatedores que comentassem mais a situação do desemprego entre os jovens no Brasil e o risco de a longo prazo acontecer uma mobilidade descendente como está ocorrendo na Europa, com os filhos ficando em condições sociais e de emprego inferior àquela dos pais.

Helena Hirata
Helena Hirata

Tendo como referência os metalúrgicos da indústria automobilística e os empregados domésticos, Helena comentou "a contradição entre a conscientização de classe nas últimas décadas e as demissões". Perguntou também aos debatedores se haverá movimentos sociais de resistência ao desemprego.

Respondendo à questão sobre os jovens, Anselmo Luís dos Santos reforçou o que dissera durante sua apresentação, de que houve uma redução expressiva do desemprego entre os jovens até 2013, apesar de ele ter se mantido elevado e agora apresentar um crescimento grande: "Quando a economia desacelera, eles são os primeiros a ficar desempregados; depois, quando a economia se recupera, eles são os últimos a  ser incorporados".

Santos disse que há um problema estrutural com os jovens brasileiros, já que 16% deles (entre 15 a 29 anos) não estudam e não trabalham (não estão incluídos os desempregados).

Citando um economista gaúcho, Lúcia dos Santos Garcia afirmou que existe um fosso estrutural entre a realidade do jovem da família operária de base ("diferente da 'aristocracia' operaria, que negocia o PDE") e o jovem de classe média, "que frequenta escola privada e tem outras perspectivas".

A partir de 2004, foi feito "um aceno de esperança" para esses jovens, mas "essa geração levará um tombo, que é o tombo da frustração, da falta de perspectiva e do descenso social generalizado".

A sociedade brasileira aceitará recuar? Essa é a grande incógnita, segundo Lúcia: "Haverá resistência? Se ela existir, o movimento sindical operário vai liderá-la?".

José Darin Klein disse que o espectro das manifestações de 2013 refletiu o contraste entre o que a sociedade quer e o que foi feito nos anos 2000. Ele considera que houve um crescimento das manifestações em 2015, mas com parte delas resultante de "uma onda conservadora que enxerga como única forma de resolver tudo derrubar a presidente, mas sem propor nada para depois disso".

Ele também considera uma incógnita se surgirá um movimento de desempregados. "Não há nenhuma instituição que esteja se organizando com essa perspectiva. As centrais sindicais estão priorizando a questão do emprego e vinculando isso à mudança da política econômica."

Márcio Pochmann concluiu o debate dizendo que as experiências dos anos 80 e 90 talvez sirvam pouco para explicar o que o país vivencia atualmente. "As manifestações dos desempregados da indústria nos anos 80 foi num momento em que a atividade industrial representava 35% do PIB; hoje ela corresponde a apenas 9%. Nos anos 90, as manifestações foram impulsionadas mais fortemente por trabalhadores das empresas estatais."

Apesar de julgar que o país tem condições de superar mais essa crise, Pochmann considera que o quadro atual parece se encaminhar para o "crime perfeito", na medida em que "evoluímos de uma crise política sem saída para uma crise econômica, dessa para uma crise social de grandes proporções e nos encaminhamos para uma crise institucional de grande monta em 2016, porque se soma à recessão a desagregação do sistema administrativo brasileiro".

SISTEMA BANCÁRIO

Há ainda, segundo Pochmann, a perspectiva de uma crise bancária de grandes proporções no início de 2016, decorrente dos empréstimos que as grandes construturas tomaram dos bancos públicos e dos fundos previdenciários para atividades vinculadas principalmente ao setor de petróleo e gás.

"As empresas que estão sendo investigadas na operação Lava Jato saíram do cadastro de fornecedores e não podem ser contratadas para novas atividades. Elas estão com ativadas paralisadas, não podem participar de outras licitações e não podem vender os seus ativos. Se não fecharem contratos até janeiro de 2016, não terão condições de pagar o crédito tomado, estimado em US$ 400 bilhões, afiançado por bancos privados."

Segundo ele, se os bancos públicos não receberem pelos empréstimos, "irão atrás dos afiançadores, que tem como ativos as obras que seriam construídas". A exigência de dinheiro do Estado vai ser muito maior, segundo ele, "para evitar a quebradeira desses grandes bancos". O resultado disso pode ser a perspectiva de "um Proer [Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional] muito mais avantajado do que aquele de 1995".

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