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'Estudos Avançados' 81 analisa trabalho, emprego e renda

por Mauro Bellesa - publicado 22/08/2014 11:55 - última modificação 11/09/2015 15:34

Edição 81 da revista será lançada em setembro e contém dossiê com 16 artigos sobre questões ligadas ao trabalho.

Carteira de TrabalhoO dossiê "Trabalho, Emprego e Renda" da nova edição da revista "Estudos Avançados" (nº 81), a ser lançada em setembro, contém 16 artigos de 29 especialistas sobre temas como as transformações do trabalho no Brasil; a expansão das classes médias; a formação profissional; a persistência do trabalho similar ao escravo; o paradoxo entre o baixo crescimento da economia e a maior oferta de emprego; a transnacionalização do trabalho; e a visão sindical sobre a legislação, o salário mínimo e a redução do desemprego.

De acordo com Alfredo Bosi, editor da revista, o objeto do dossiê é a conjuntura atual do Brasil como lócus do trabalho, do emprego e do desemprego. Ele destaca que os especialistas convidados contribuíram para a apresentação metódica dos dados básicos, extraídos dos censos, das estatísticas e tabelas publicadas por órgãos confiáveis, governamentais e sindicais. Além disso, "a visão em bloco do estado da questão foi largamente compensada pela pesquisa regional".

O editor acrescenta que "junto aos dados vêm as interpretações estruturais e conjunturais que buscam entender a complexa rede de interações entre o desempenho relativamente feliz do emprego nos últimos anos e as vicissitudes da política econômica com seus modestos índices de crescimento".

Classe médiaCLASSES MÉDIAS

Pierre Salama, professor emérito da Université Paris 8, França, abre o dossiê com o artigo "As Classes Médias Podem Dinamizar o Crescimento do PIB nas Economias Emergentes?”. Para ele, a expansão das classes médias não é a causa das dificuldades de crescimento.

Salama explica que as classes médias constituem “objeto dificilmente identificável” e sua expansão é mais o resultado do crescimento do que sua causa. Além disso, considera que o contexto da liberalização do comércio e a evolução das tecnologias "não permitem mais a correspondência virtuosa, que pôde ser constatada no passado, entre a demanda de bens de consumo duráveis e as dimensões ótimas para produzir esses bens".

“É o conjunto das demandas colocadas pelos segmentos pobres, vulneráveis e as classes médias que pode permitir dinamizar o mercado interno, se ao mesmo tempo certas condições são preenchidas visando limitar o peso das rendas e transformar essas economias de rentistas em economias produtivas.”

POLÍTICA ECONÔMICA

Paulo Baltar, professor do Instituto de Economia e Pesquisador do Centro de Estudos Sindicais (Cesit) e Economia da Unicamp, autor da contribuição "Política Econômica, Emprego e Política de Emprego no Brasil", examina, a partir da constatação da relação entre o grau de estruturação do trabalho assalariado e a condição socioeconômica da população, as tendências recentes de geração de emprego e renda no Brasil, as quais associa com o desempenho da economia em termos de crescimento do PIB e ritmo da inflação.

Baltar destaca a importância do Estado na regulação da economia e do mercado de trabalho e comenta as perspectivas de evolução do emprego diante da crise mundial, levando em conta mudanças no tamanho e perfil da População Economicamente Ativa (PEA), consequência da dinâmica demográfica e da participação na atividade econômica de homens e mulheres de diferentes idades.

João Sabóia, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também trata do desempenho econômico do país e do mercado de trabalho. No texto "Baixo Crescimento Econômico e Melhora do Mercado de Trabalho – Como Entender a Aparente Contradição?", Sabóia discute a evolução favorável do mercado de trabalho a partir de 2004, quando passou a apresentar, simultaneamente, aumento dos salários e redução do desemprego e da informalidade.

O artigo enfatiza o triênio 2011/2013, quando a economia desacelerou fortemente e o mercado de trabalho continuou apresentando resultados positivos. O argumento central de Saboia é que tal performance ocorreu por conta do baixo nível da produtividade do trabalho, que favoreceu a criação de uma grande quantidade de empregos pouco produtivos e mal remunerados.

TRANSFORMAÇÃO

No artigo "Brasil, Segunda Grande Transformação no Trabalho?", Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia e pesquisador do Cesit da Unicamp, afirma que “a marcha da valorização do trabalho ocorre pela queda do desemprego associada à elevação do emprego assalariado formal”.

Ele ressalta que, simultaneamente ao aumento real do salário mínimo, registra-se o crescimento dos salários acima da inflação, o que expressa o vigor da retomada dos sindicatos em incorporar ganhos de produtividade gerados pela economia.

No entanto, “para que o curso da grande transformação do trabalho não reproduza os equívocos observados entre as décadas de 1930 e 1970, a questão social exige um tratamento inovador em direção à maior eficiência e eficácia das políticas sociais e laborais”.

Para Ricardo Antunes, professor de sociologia do trabalho da Unicamp, que participa com o trabalho "Desenhando a Nova Morfologia do Trabalho no Brasil", ao contrário das teses que advogam a perda de relevância do trabalho no mundo contemporâneo, "estamos desafiados a compreender sua nova morfologia, cujo elemento mais visível é o seu desenho multifacetado, resultado das fortes mutações que afetaram o capitalismo nas últimas décadas".

Em sua opinião, essa nova morfologia compreende “desde o operariado industrial e rural, até os assalariados de serviços, os novos contingentes de homens e mulheres terceirizados, subcontratados e temporários, que se ampliam no Brasil”.

ASPECTOS LEGAIS

"O Trabalho à Procura de um Direito: Crise Econômica, Conflitos de Classe e Proteção Social na Modernidade" é título do artigo de Antonio Rodrigues de Freitas Jr., professor da Faculdade de Direito (FD) da USP. Segundo ele, para determinar o conteúdo e o sentido das mudanças jurídicas do trabalho necessárias é preciso levar em conta os fatores que causaram o declínio do welfare state, pois este “foi não apenas o mais conhecido projeto político, como aquele que chegou mais perto de conciliar democracia e distribuição de renda”.

Cássio da Silva Calvete, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e  Mariana Hansen Garcia, jornalista, são os autores de "A Convenção 151 da OIT e seus Impactos para os Servidores Públicos no Brasil".

No trabalho, eles analisam as dificuldades que o Brasil enfrenta para regulamentar a Convenção 151, que trata das relações trabalhistas no setor público, buscando melhores condições de trabalho para esses empregados. O texto também traça a evolução do processo de institucionalização da negociação coletiva no setor público brasileiro.

As principais iniciativas adotadas pelo governo brasileiro para a erradicação do trabalho escravo são descritas no artigo "O Enfrentamento do Trabalho em Condição Análoga à de Escravo", de Alexandre Rodrigo T. da C. Lyra, do Ministério do Trabalho e do Emprego.

HISTÓRIA

No texto "O Trabalho no Brasil: Traçado Interpretativo de sua História de Formação e de sua Crítica", Heinz Dieter Heidemann e Carlos de Almeida Toledo, professores da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, e o doutorando em geografia Cássio Arruda Boechat discutem a formação e crise do trabalho no Brasil.

Os pesquisadores tratam da territorialização do capital  como processo particular de expropriação regional marcada por relações de trabalho especificas, até que as condições sociais do assalariamento estivessem formadas. Analisam também o ressurgimento do trabalho escravo no Brasil como forma de manifestação do colapso da modernização enquanto fenômeno mundializado.

Lucia Garcia, do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), e Leila Luiza Gonzaga, da Fundação Seade, contribuem com "Pesquisa de Emprego e Desemprego: Trinta Anos de Acompanhamento do Mercado de Trabalho na Região Metropolitana de São Paulo". Relatam que a pesquisa foi implantada em outubro de 1984, pela Fundação Seade e pelo Dieese, como uma tentativa de retratar um mercado de trabalho complexo e heterogêneo  de forma comparável às estatísticas internacionais.

De acordo com as autoras, "nesses trinta anos de PED, as principais mudanças no mercado de trabalho da RMSP foram: menor patamar da taxa de desemprego total e de suas componentes; aumento da taxa de participação feminina e redução da taxa de participação dos jovens; maior formalização das ocupações; maiores oscilações da PEA; e a redução da distância entre os rendimentos do trabalho dos mais ricos e dos mais pobres”.

As alterações nos diferenciais de rendimentos entre migrantes, migrantes de retorno e não migrantes no Brasil entre 2000 e 2010 são o tema do artigo "Migração e Rendimentos no Brasil: Análise dos Fatores Associados no Período Intercensitário 2000-2010", de Ana Flávia Machado, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Luiz Carlos Day Gama, doutorando da mesma universidade.

Entre os principais constatações do estudo estão o fato de que ser homem, jovem e escolarizado eleva a probabilidade de migrar e retornar, que migrantes e migrantes de retorno são mais bem remunerados que não migrantes e que a situação dos trabalhadores melhorou no período, pois houve elevação dos rendimentos e diminuição das desigualdades regionais de renda, tendo a migração contribuindo para isso.

FORMAÇÃO PROFISSIONAL

A experiência de qualificação profissional no Brasil  é o tema de artigo de Tarcisio Patricio de Araujo e Roberto Alves de Lima, ambos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). No trabalho, intitulado  "Formação Profissional no Brasil: Revisão Crítica, Estágio Atual e Perspectivas", os pesquisadores apontam que o atual padrão educacional restringe o avanço da formação profissional da força de trabalho e os números da qualificação profissional no país se contrapõem aos resultados obtidos.

Mantido o panorama atual, os pesquisadores  acreditam que o cenário mais provável é que "a eventual elevação da taxa de crescimento da economia continuará sendo restringida pela insuficiência de força de trabalho qualificada”.

Sylvio Mário Puga Ferreira, da Faculdade de Estudos Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), e Lissandro Botelho, do Instituto Federal do Amazonas (Ifam) tratam do mercado de trabalho no Polo Industrial de Manaus (PIM) no artigo "O Emprego Industrial na Região Norte: O Caso do Polo Industrial de Manaus"

Os autores discutem  a divisão social do trabalho e tecem observações sobre empregos no PIM, a partir da análise de banco de dados local. A partir dessa análise, recomendam uma estratégia para promover a qualificação do operariado do polo, assim como atrair e manter empreendimentos que ofertem empregos melhores com salários médios maiores.

Em "Aprendizagem Profissional: Trabalho e Desenvolvimento Social e Econômico", Ana Lucia de Alencastro Gonçalves, do Ministério do Trabalho e Emprego, trata dos efeitos da aplicação das Leis nº 8.213/91 e nº 10.097/2000, que dispõem, respectivamente, sobre cotas obrigatórias para garantir que empresas mantenham em seus quadros um percentual de pessoas com deficiência e, independentemente, incluam o percentual mínimo de 5% de adolescentes e jovens por intermédio dos contratos especiais de trabalho.

VISÃO SINDICAL

"As Centrais Sindicais e os Temas Trabalhistas" reúne as respostas dadas por Vagner Freitas de Moraes, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Edson Carneiro Indio, secretário geral da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, e Antonio Neto, presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), a três perguntas formuladas pelo editor da revista:

  1. Qual a posição de sua central sindical em relação à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): ela deve ficar nos termos atuais ou deve ser reformada? Em caso de reforma, que mudanças lhe parecem mais importantes?
  2. Como deveria ser repensada a forma de constituir o salário mínimo? O que o salário mínimo significa, hoje, para os trabalhadores? Em que as alterações do salário mínimo afetam realmente a economia nacional?
  3. A que se deve a diminuição atual do desemprego no país, considerando que a crise nesse setor continua abalando as economias dos países desenvolvidos?


TRANSNACIONALIZAÇÃO

O artigo "Determinantes Industriais da Solidariedade Transnacional: Política Intersindical Global em Três Setores",  de autoria de Mark Anner, Ian Greer, Marco Hauptmeier, Nathan Lillie e Nik Winchester, pesquisadores em universidades do Reino Unido, EUA e Finlândia, compara formas de transnacionalismo do trabalho na indústria automotiva, no transporte marítimo e em vestuário/ indústria têxtil.

De acordo com os autores, os sindicatos se envolvem em atividades transnacionais muito diferentes em cada caso para reassumir o controle sobre o mercado de trabalho e a concorrência. “Conforme as instituições de cooperação transnacional se tornam mais complexas, os sindicatos continuam a lutar com as tensões competitivas (trabalhador a trabalhador e sindicato a sindicato), que variam de uma indústria para a outra.”

A edição 81 de “Estudos Avançados” é completada com a seção "Resenhas", na qual seis textos tratam de sete livros sobre a geopolítica americana, a vida de frei Tito de Alencar (1945-1974), a estrutura social brasileira nos anos 2000, a obra científica de Mario Schönberg, a análise sociológica do papel desempenhado pelos catadores na indústria de reciclagem e a nova edição de "Invenção de Orfeu", de Jorge de Lima.

"Estudos Avançados" nº 81, 296 páginas, R$ 30,00 (assinatura anual com três edições por R$ 80,00). Informações sobre como adquirir exemplares ou assinar a publicação podem ser obtidas por meio de mensagem a edilma@usp.br.

Foto: Marcos Santos/USP Imagens