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IEAs indiano e da USP destacam importância do pensamento inovador

por Sandra Codo - publicado 05/07/2012 00:00 - última modificação 12/02/2016 10:18

Alguns institutos de estudos avançados funcionam apenas com pesquisadores estrangeiros sem atividades predeterminadas, como é o caso do IEA da Universidade Jawaharlal Nehru (JNU), de Nova Delhi, Índia. Outros, como o IEA-USP, atuam com pesquisadores nacionais e estrangeiros em projetos individuais ou inseridos em grupos temáticos. Os perfis são variados, mas uma diretriz é comum a esse tipo de instituto: o estímulo à reflexão livre, interdisciplinar e inovadora.

Alguns institutos de estudos avançados funcionam apenas com pesquisadores estrangeiros sem atividades predeterminadas, como é o caso do IEA da Universidade Jawaharlal Nehru (JNU), de Nova Delhi, Índia. Outros, como o IEA-USP, atuam com pesquisadores nacionais e estrangeiros em projetos individuais ou inseridos em grupos temáticos. Os perfis são variados, mas uma diretriz é comum a esse tipo de instituto: o estímulo à reflexão livre, interdisciplinar e inovadora.

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Aditya Mukherjee e Martin Grossmann apresentaram as propostas dos dois institutos a um grupo de convidados

Em encontro realizado em 25 de junho, essa característica marcante ficou evidente na apresentação das propostas de trabalho do Instituto de Estudos Avançados Jawaharlal Nehru (JNIAS) e do IEA-USP por seus diretores, Aditya Mukherjee e Martin Grossmann, respectivamente.

INSTITUTO GLOBAL

Para situar o contexto da criação do JNIAS em 2004, Mukherjee destacou que a JNU surgiu em 1969 para estimular o desenvolvimento das ciências sociais na Índia de forma semelhante ao crescimento apresentado pelas ciências naturais nos anos 50 e 60.

"A JNU é uma universidade pública e gratuita criada com o objetivo de ser um centro de pensamento independente, que não replicasse os centros de reflexão do Ocidente; de abrangência nacional, com o recrutamento de estudantes de toda a Índia; e secular, no sentido indiano do termo: não avessa à religião, mas sem ligação com nenhuma delas."

O JNIAS tem por meta ser um instituto global. Todos os residentes são estrangeiros e de preferência de lugares do mundo com pouco intercâmbio acadêmico com a Índia. Já contou com a participação de pessoas de 25 países, inclusive um microbiologista brasileiro. "O desafio é conseguir um bom pesquisador. Quando isso acontece, basta sua presença no instituto. Todos o convidarão e ele ficará ocupado o tempo todo com palestras, seminários e contatos com os estudantes," comentou.

Para estimular a troca de ideias e experiências, o JNIAS funciona em um prédio próprio, com apartamentos onde vivem seus integrantes e espaços para convivência e eventos. Atualmente há 14 pesquisadores residentes e o objetivo é atingir 30, de acordo com Mukherjee. O instituto procura sempre contar com a participação de pelo menos uma pessoa das áreas de criação (artes visuais, cinema, teatro, literatura etc.), "que é sempre quem faz as perguntas mais difíceis nas apresentações de cientistas".

Mukherjee disse que um dos casos mais bem sucedidos foi a residência do dramaturgo, poeta e ativista social sul-africano Ari Sitas, que trabalhou com Nelson Mandela no movimento de reconciliação da África do Sul: "Não lhe pedimos para ensinar. Ele simplesmente veio e foi convidado a trabalhar no país inteiro. Isso é o melhor que podemos fazer. A universidade, a cidade, o país devem se beneficiar das pessoas que conseguimos trazer".

TRANSIÇÃO

"O IEA-USP é vanguarda no sistema conservador que é a Universidade. Não que ela seja do passado. De forma alguma. Ela é o bastião do conhecimento. Mas para se atualizar, estar em sintonia com novas realidades, precisa de agentes como o IEA", comentou Grossmann na sua apresentação.

Ele considera que o Instituto está numa fase de transição, depois de seus primeiros 25 anos com um perfil de atuação tipicamente modernista, baseado nas contribuições de grandes nomes da ciência e da cultura. "É preciso resgatar o seu papel de lugar do debate, da troca de experiências, onde encontros impossíveis se tornem possíveis e aqueles irreconciliáveis confrontem suas ideias."

A preocupação de Grossmann na passagem para uma conjuntura pós-modernista é como o Instituto poderá agir de forma mais metacrítica, mais consciente da constituição de novas centralidades: "É preciso promover mudanças no sistema operacional do IEA, não só para ele se relacionar com o que acontece, mas também para ter a ambição de promover transformações".

Foi com esse espírito que Grossmann apresentou seu Projeto de Gestão 2012-2017 ao Conselho Deliberativo do Instituto em maio. Nele, propôs a instituição de um novo modo de organização das atividades: a organização de temáticas que "permitam uma melhor ideia de identidade do IEA, deixando mais claros os objetivos e metas e aprimorando a comunicação entre os grupos de pesquisa".

METACURADORIAS

As temáticas serão tratadas como metacuradorias, uma concepção de gestão mais crítica e mais transparente em termos das linguagens utilizadas, segundo Grossmann. "Em vez de dar voz a um sujeito, empoderar um curador, a metacuradoria já parte do princípio de que os organizadores são vários: um grupo interdisciplinar que dê conta de temáticas urgentes que merecem atenção científica ou cultural". As metacuradorias previstas no projeto são quatro: O Comum, Transformação, Glocal e Abstração.

O Comum será o espaço da coletividade, do acesso, do bem-estar, da democracia, dos direitos humanos, da justiça social, das ambiências e interfaces socioculturais. "A escolha dessa temática surgiu de uma análise crítica da USP, sobre como tratar a questão da democracia e do diálogo entre os setores que a compõem, sobre como dialogar com a sociedade e a ela prestar contas." Grossmann informou que o desembargador José Renato Nalini, conselheiro do IEA, já propôs um tema de análise: a judicialização da vida brasileira, com todas as disputas entre os indivíduos sendo levadas aos tribunais.

A metacuradoria Transformação tem por objeto a educação e sua capacidade de transformar. "Os governos do país desde a redemocratização não apresentaram projetos claros de educação. Se o Brasil pretende se tornar uma centralidade e atrair conhecimentos e experiências, tem de passar por uma transformação imbricada no social e aí a educação torna-se fundamental para transformar a sociedade."

Para Grossmann, essa metacuradoria poderia inclusive abrigar as discussões sobre o futuro da USP.
O Glocal é em si um paradoxo, com a presença de contradições, desigualdades e impropriedades: "É um conceito que os pensadores pós-modernistas têm utilizado com frequência para entender as relações entre a globalização e os processos locais e como estes são neutralizados por aquela. Nesse aspecto, o IEA pode ser um parceiro na elaboração da política de internacionalização da USP, inclusive na identificação de outros parceiros além de universidades norte-americanas e europeias".

A metacuradoria Abstração volta-se para as especulações teóricas, filosofia, pensamento abstrato em geral, uma vez que é a partir dessas reflexões que a ciência define seus rumos e, no final, possibilita aplicações diversas do conhecimento. Grossmann destacou que esse ponto de reflexão, de pensamento do novo e de novas interfaces é fundamental no desenvolvimento de um instituto como o IEA.

Ele pensa inclusive na possibilidade de uma Academia IEA e citou como prenúncio disso um projeto formulado no âmbito da Ubias, rede de IEAs vinculados a universidades, da qual o JNIAS e o IEA fazem parte. Nesse projeto, 30 jovens pesquisadores com potencial para serem líderes nas suas áreas de conhecimento passarão por uma imersão de um mês na IEA-USP e depois mais um mês no Instituto de Pesquisa Avançada da Universidade de Nagoya, Japão, sob a tutoria de três cientistas de prestígio internacional.

APLICAÇÃO

Em complemento às metacuradorias, Grossmann propõe a criação de um Programa de Altos Estudos Dirigidos: "A USP recentemente ampliou as atividades  em Santos, tendo em vista as descobertas do Pré-Sal. A USP está dando respostas à formação de profissionais e ao desenvolvimento de tecnologias para a área. Mas será que não existem outras demandas reprimidas ou que se possam imaginar para o futuro próximo?"

Por fim, destacou que o IEA pretende fazer pleno uso das transmissões em alta definição possibilitadas pela internet 2 e com isso propiciar a existência de residências virtuais:  "Um formato previsto é o de debates com telepresença, com a participação de pessoas ao redor do mundo em um cenário digital avançado".

Foto: Mauro Bellesa/IEA-USP