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Bebê Eugênico de 1929, escolhido por instituições de saúde pública da cidade de São Paulo |
Nos anos 30 e 40, em São Paulo, a maioria das especialidades médicas trazia em seus estudos dimensões eugênicas, entendidas como “tecnologia científica” a ser implementada, segundo o historiador André Mota, coordenador do Museu Histórico e professor da Faculdade de Medicina da USP. Naquele período, ações eugenistas ambientais e mesmo medidas para impor restrições e até a supressão de indivíduos foram tema de longos debates entre subdivisões da corporação médica, afirma Mota, que tratará dessas discussões na conferência Racismo e Eugenia: Um Debate Médico Paulista nos Anos de 1930-1940, no dia 4 de dezembro, às 10h30, no IEA.
A conferência é organizada pelo Grupo de Pequisa Khronos: História da Ciência, Epistemologia e Medicina. A moderação será de Gildo Magalhães dos Santos Filho, professor da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e coordenador do grupo de pesquisa. A participação é gratuita e aberta ao público, mas requer inscrição prévia. Não é preciso se inscrever para assistir ao evento ao vivo pela internet.
Tecnicismo
Durante os anos 1920-1930, explica Mota, a medicina liberal do tipo artesanal, correspondente ao modelo tecnológico do consultório particular, passou a ser substituída por "um modelo de medicina tecnológica, em arranjos de base progressivamente tecnicistas, com o paulatino empresariamento da assistência médica".
Pensada até então como uma prática exercida de “indivíduo para indivíduo”, a medicina começa a entrar em contradição dentro do contexto de transição, caracterizado por novas articulações entre o Estado, o sistema político e a sociedade civil, afirma o historiador.
"Esse novo contexto explicitava as mudanças de um profissional de conhecimento integral ao novo profissional, mais técnico e específico, apto às demandas tecnoassistenciais de acesso aos cuidados médicos nos centros urbanos e rurais e com novas formas de produção social de serviços."
Mota destaca que exigia-se a “especialidade” como deflagradora de políticas nos campos da pesquisa, da clínica e das organizações de caráter profilático. "Ao entendermos o médico como um intelectual orgânico, capaz de interagir em dois níveis da estrutura social - como intelectual de uma ciência específica e como produtor de símbolos em torno de sua profissão e de sua ação política -, é preciso circunscrevê-lo num espaço de rupturas, reorganizações corporativas, dissensões políticas e simbólicas."
Nesse contexto paulista de mudanças corporativas nos anos 30, a eugenia será recebida como um termo médico e, em razão disso, incorporada às diversas especialidades, comenta o historiador. "Demarcavam-se estratégias na busca de um homem ideal, reconhecido em sua individualidade para ser modificado, pois dizia-se que nem todos tinham as mesmas chances de ascender de seu estado considerado mórbido e degenerado." Incluída entre os responsáveis por essa "missão", a corporação médica "teve papel decisivo na discussão sobre como a eugenia podia ser ou não praticada", disse Mota.