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Pacto de governança integrada para a sustentabilidade das metrópoles

por Sylvia Miguel - publicado 26/11/2015 14:55 - última modificação 03/08/2018 17:58

Para gestores, sociedade civil organizada tem papel fundamental para metas de desenvolvimento e medidas de adaptação às mudanças climáticas.
Poluição Atmosférica
O calendário para corrigir os danos causados pelo aquecimento climático global será o grande desafio da COP 21.

Sem um pacto de governança integrada e sem a participação da sociedade civil organizada, não será possível estabelecer nas grandes cidades brasileiras metas de desenvolvimento e nem medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas globais. Essa foi a mensagem dos gestores públicos que participaram do debate As Mudanças Climáticas e as Megacidades: Mobilidade Sustentável, Saúde Pública e Planejamento do Crescimento, no dia 19 de novembro no IEA.

Esse foi o 4º encontro da série organizada pelo Incline (Núcleo de Apoio a Pesquisa sobre Mudanças Climáticas) da USP e o Grupo de Pesquisa Meio Ambiente e Sociedade do IEA. O ciclo A Caminho da COP 21: Preparando o Terreno até Paris – Mudanças Climáticas, Adaptações, Soluções e Oportunidades vem acontecendo desde setembro e já tratou dos temas água, energia e segurança alimentar.

As exposições sobre o tema megacidades reuniram no IEA alguns exemplos de políticas públicas para mitigação e adaptação às mudanças climáticas globais que estão em andamento em três cidades brasileiras. A coordenação do debate foi de Tomas Alvim, da Arq.Futuro

Luiz Firmino Pereira, superintendente de Planejamento Metropolitano da Secretaria de Governo do Estado do Rio de Janeiro, falou sobre o pacto pelo saneamento e para a eliminação dos lixões que vem sendo implantado na capital carioca.

Engenheiro civil e atual secretário de Planejamento e Coordenação Geral do governo do Estado do Paraná, além de ex-prefeito de Maringá por dois mandatos (2005-2012), Silvio Barros mostrou como uma parceria da sociedade civil organizada, iniciada com o Movimento Repensando Maringá, vem impulsionando o desenvolvimento estratégico daquele município e de sua região metropolitana.

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Lauro Pinotti, arquiteto e presidente do Instituto de Planejamento e Pesquisas de Piracicaba (IPPLA), falou da Agenda 21 do município de Piracicaba e das medidas que vêm redirecionando o crescimento da economia local e buscando eixos de mobilidade no município, apesar das dificuldades de harmonização no campo político.

Adensamento

“Já está comprovado que o adensamento populacional traz ganho econômico e promove o desenvolvimento sócio-espacial. O tempo e o dinheiro gasto com transportes em grandes distâncias percorridas no perímetro urbano ainda são um grande desafio não só em Piracicaba, mas na grande maioria das cidades brasileiras. O pior é que as pequenas cidades seguem o mau exemplo de expansão do território que gera tantos problemas nas metrópoles”, disse Pinotti.

Segundo o gestor, Piracicaba vem buscando promover a centralidade nas macrorregiões, levando oferta de empregos e serviços em determinadas localidades. “Um grave problema é que o município possui um perímetro muito grande e fica difícil conter a expansão. O aumento da área urbana não corresponde ao aumento da população”, disse.

As alterações no plano diretor pretendem contemplar um reposicionamento das instituições e dos equipamentos públicos, buscar as vocações setoriais de cada macrorregião, o redesenho de áreas verdes e a exploração do potencial de parques lineares, entre outras medidas, segundo o presidente do IPPLA.

Mas ainda há o desafio de governança. “Questões políticas com o governo local ainda continuam inviabilizando qualquer iniciativa de planejamento de médio e longo prazo”, disse Pinotti.

Mobilidade

A expansão territorial na cidade do Rio de Janeiro é tão severa que as distâncias lineares na cidade chegam a 110 quilômetros de distância. Em 12 anos, estará esgotado o solo disponível no perímetro urbano, disse o superintendente de Planejamento Metropolitano da Secretaria de Governo do Estado do Rio de Janeiro.

Firmino disse que os cidadãos sofrem as consequências de adotar o “modelo automóvel”. O desenho de linhas de trens já chegou a atender 1,4 milhão de habitantes ao dia, mas agora atende a 800 mil habitantes ao dia, numa cidade em que 75% dos empregos estão na zona central, comparou.

“Infelizmente, as pessoas cultuam uma mentalidade de entrar numa condução na porta do condomínio e descer na porta do emprego, mesmo que levem duas ou até três horas no trânsito. Não há o hábito de troca de modais, como em cidades desenvolvidas, em que as pessoas usam diferentes tipos de transportes para chegar ao destino”, disse.

Promover a oferta de empregos fora do centro é uma medida que a cidade vem buscando para incentivar o adensamento, ou a centralidade em macrorregiões, disse Firmino. O mote do programa “Onde o emprego vai morar” está tentando encontrar saídas para rever a acessibilidade e a estrutura logística no Rio, disse.

Mobilidade urbana e congestionamento
Modelo de transporte privado e má distribuição da oferta de emprego comprometem mobilidade urbana.

A mobilidade e o ordenamento do território são dois dos cinco temas prioritários incluídos no plano metropolitano do Rio. O saneamento básico, os tratamentos do lixo e da água são um terceiro eixo, seguido de comunicação digital e mudanças climáticas ligadas à resiliência da metrópole, disse.

Segundo o gestor, 94% dos lixões já foram desativados no Rio e os pequenos municípios da região metropolitana estão recebendo incentivos como a redução de impostos para que isso ocorresse.

O superintendente acredita que o saneamento básico pode ser “a grande liga” para por em funcionamento o processo de governabilidade e de governança integrada nas metrópoles.

“É preciso cruzar subsídios entre governos e prefeituras para dar conta desse grande desafio. Os custos para a recuperação da Baia de Guanabara, por exemplo, envolvem algo como 20 bilhões de Reais. Sua recuperação deve ser um plano de Estado e não de governo”, ressaltou.

Os 8 milhões de habitantes do entorno da Baia de Guanabara contam com uma taxa de tratamento de esgoto de apenas 30%, estimou Firmino. “O dado oficial informa que existe 70% de coleta e tratamento. Mas isso é falho porque afastamento do esgoto não significa tratamento”, disse.

Para o superintendente, “os prefeitos precisam entender que buscar a governabilidade não é perder poder e sim ganhar”. Lembrou que os governantes devem superar a visão de político e de mandato e começar a enxergar programas de Estado.

“Um consórcio de prefeituras no Rio de Janeiro vem alcançando grande sucesso. Não há um candidato a prefeito que não mencione seu compromisso com o consórcio”, disse.

Oportunidades

Tomas Alvim, Silvio Barros, Luiz Firmino Pereira e Lauro Pinotti

A partir da esq.:Tomas Alvim, Silvio Barros, Luiz Firmino Pereira e Lauro Pinotti.

“As pessoas e os gestores precisam estar dispostos a investir tempo e dinheiro na cidade e estar apaixonados por ela, a fim de viabilizar o desenvolvimento e reverter as vulnerabilidades em oportunidades”, disse o ex-prefeito de Maringá.

Silvio Barros lembrou a iniciativa de diferentes segmentos empresariais e entidades locais que a partir de 1990 iniciaram o Movimento Repensando Maringá. O movimento culminou com a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico de Maringá (Codem). Criado em 1997, o organismo é responsável pela gestão do Fundo Municipal de Desenvolvimento Econômico e formula políticas que influenciam nos rumos do futuro da cidade.

O secretário de Planejamento e Coordenação Geral do governo do Estado do Paraná lembrou que para existir governabilidade, o poder público precisa ser legítimo, mas a legitimidade vem do interesse coletivo e não de grupos de interesse.

“Estamos cansados de ver nas mídias exemplos de boas práticas que não são praticadas ou não são replicadas. Cabe à gestão pública criar mecanismos para que elas aconteçam. Mas sem a parceria da sociedade civil organizada, não vejo saída para que isso aconteça”, disse Barros.

Em Maringá, o IPTU já é progressivo. O Plano Diretor também prevê que os novos loteamentos sejam obrigados a construir espaços de ciclovias e ciclo faixas.

Segundo o secretário, todos precisam estabelecer uma relação com a sustentabilidade. “A sociedade deve entender que tratar desses problemas não tem a ver só com governos ou municípios. Tem a ver comigo, com você, com cada um. O que não fizermos para adaptação às mudanças climáticas, vamos pagar de uma outra forma na outra ponta”, ressaltou.

A sociedade civil organizada de Maringá está olhando para o futuro, disse Barros. “Foi feito um Master Plan para desenvolvermos as potencialidades do território. Mapeamos as atividades que sustentam a base econômica da região e descobrimos vocações naturais, vulnerabilidades e oportunidades para inovação”.

Pacto global

Para especialistas de questões climáticas, o fato de 164 países terem apresentado seus planos nacionais de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) sinaliza que um número sem precedentes de países já começaram a implementar políticas climáticas a nível nacional.

Nos iNDCs apresentados ao Secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), muitos países incluíram ações no domínio da terra e florestas, caso do Brasil. O REDD + é mencionado em diferentes contextos, na sua maioria em países tropicais, segundo Stephen Leonard, presidente da organização não-governamental Climate Justice Programme, da Austrália.

Apesar das medidas dos governos locais, o planeta continua sua trajetória de aquecimento global além dos limites de segurança. As avaliações das iNDCs mostram que o mundo deverá ultrapassar a meta de 2 graus centígrados para este século, com estimativas de alcançar entre 2,7 e 3,5 graus de aquecimento até 2100.

A devastação social e ambiental ao redor do mundo já vem sendo sentida. O calendário para corrigir essa situação será o grande desafio da COP 21. Há fortes argumentos da ciência que sustentam a necessidade urgente de descarbonização mundial por completo até 2050. Mas a tendência dos gestores e políticos deverá ser empurrar essa agenda para 2100, conforme avaliação de Leonard em texto publicado para a Center for International Forestry Research (CIFOR), uma rede internacional e multidisciplinar de pesquisa sobre florestas, clima e paisagem.

Dados divulgados esta semana pela NASA mostram que a temperatura média global para outubro foi 0,2 ° C mais quente que no mesmo período do ano passado. Entre os 15 anos mais quentes já registrados, 13 deles ocorreram desde o ano 2000.

O ciclo

O objetivo é consolidar um documento para levar contribuições a três eventos paralelos da sociedade civil na Conferência das Partes sobre Mudanças do Clima, a COP 21, em Paris, segundo o professor Weber Amaral, da Escola de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), um dos coordenadores do ciclo.

Os ataques terroristas do último dia 13 em Paris e o temor de que novos atentados possam ocorrer não mudaram a agenda oficial COP 21. Continuam confirmadas as presenças de mais de 100 chefes de Estado entre os dias 30 de novembro e 11 de dezembro para tratar de um novo acordo para o clima global. Até o momento, 164 países, inclusive o Brasil, já submeteram seus planos nacionais de redução de emissões, as chamadas Intended Nationally Determined Contributions (iNDCs, na sigla em inglês). Espera-se que apenas eventos públicos como shows e passeatas sejam cancelados, depois de o primeiro-ministro francês Manuel Valls anunciar que o evento deverá se resumir às negociações climáticas.

Também participaram da organização dos encontros outros dois professores da USP: Tércio Ambrizzi, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG); e Pedro Jacobi, do IEA, FE e Procam-IEE. Os encontros foram realizados com apoio da Arq. Futuro, CPFL Energia, Pacto Global Rede Brasileira (UNGC) e World Water Council.

Fotos 1 e 3: 
Maria Leonor de Calasans;
Foto 2: Mario Roberto Duran Ortiz Mariordo.