Você está aqui: Página Inicial / PESQUISA / Grupos de Pesquisa / Qualidade da Democracia / Notícias / Mesa-redonda lança blog sobre a qualidade da democracia

Mesa-redonda lança blog sobre a qualidade da democracia

por Marilda Gifalli - publicado 15/05/2013 11:53 - última modificação 15/05/2013 11:53



Estruturar um blog sobre democracia demanda questionamentos díspares quando se busca avaliação da qualidade desse tipo de regime político. Foi para discutir esses questionamentos que o Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) e o IEA realizaram a mesa-redonda Qualidade da Democracia: Conceito e Aplicação, evento de lançamento do blog "Qualidade da Democracia", no dia 29 de novembro de 2012.

Os debatedores foram os professores Joaquim Falcão, da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ), Maria Tereza Sadek, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Fernando Filgueiras, da Universidade Federal de Minas Gerais, e José Álvares Moisés, também da FFLCH, coordenador do NUPPS e idealizador do projeto do blog, em parceria com Francisco Weffort, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Políticos e Sociais (Ieps).

Álvaro Moisés disse que propor um blog sobre a qualidade da democracia representa um esforço de intervenção permanente na realidade política do país. "Há uma dimensão normativa nesse esforço e podemos dar uma contribuição para melhorar a democracia no Brasil. É evidente que essa é uma perspectiva moral e ética que não compromete em nada o esforço de análise empírica que tem que encontrar formas de mensuração, mecanismos e instrumentos para percebermos, avaliarmos diferentes dimensões da democracia brasileira".

De acordo com o cientista político, o blog é uma plataforma aberta, nascida a partir de perspectivas diversas, cujo objetivo é estabelecer um diálogo, buscar "exercer uma dimensão dialógica entre os participantes e contribuintes com aqueles que vão acessar e estar presente no blog". Segundo ele, o blog é apartidário, sem nenhuma filiação de origem e busca a participação de acadêmicos, intelectuais e pensadores para, sob ângulos diversos, partilhar ideias em um "esforço de intervenção permanente na realidade política brasileira alicerçado no conhecimento acadêmico e na pesquisa empírica".

DEMOCRACIA POLÍTICA
Maria Tereza Sadek, especialista no Poder Judiciário, disse que, ao distinguir democracia política da econômica e mesmo da social, as ciências políticas abriram caminho para "se pensar politicamente a democracia e essa ideia de qualidade a ela associada, o que implica na construção de processos, de um gradiente onde se constroem os alicerces para a qualificação da democracia".

Sadek lembrou que foi o cientista político norte-americano Robert Dahl (1915-), que sugeriu, em meados dos anos cinquenta, a construção desse método qualitativo a partir de dois eixos: em um deles a participação, que dá a ideia de competição, e, no outro, a inclusão, com a noção de democracia política entendida como cidadania política.

Ela entende que vários outros eixos devem ser acrescentados à análise de Dahl: as liberdades liberais clássicas, ou seja, liberdade de imprensa, liberdade de ir e vir, todas as liberdades civis; a ideia da vontade da maioria desde que essa vontade não implique na diminuição dos direitos das minorias; a igualdade política e a construção de sistemas de controle. Neste quesito, ela ressalta a importância de não se afrouxarem os sistemas de controle da qualidade da democracia sob pena de essa qualidade decair.

INSTITUIÇÕES
O cientista político Fernando Filgueiras por sua vez construiu sua reflexão sobre a qualidade da democracia tanto como um processo democrático como também do ponto de vista ético-moral dos valores desse regime político.

Ele elencou vários eixos que devem ser analisados quando se pretende qualificar a democracia. Políticas públicas, impacto da democracia nas políticas públicas, processos políticos ligados à análise dos sistemas eleitorais e comportamento político são alguns deles. Outro ponto que considera inovador, dentro da teoria democrática, é a análise política vinculada à dimensão do desenvolvimento institucional da democracia e de suas diversas instituições.  Cita como exemplos os sistemas partidário e eleitoral, o desenvolvimento de sistemas de controle das instituições e os tribunais de contas.

Mas, além disso, qualificar a democracia também representa mostrar sua antítese, ou seja, "pensar a relação da qualidade da democracia e o problema da corrupção". E a corrupção deve ser pensada como processo de degeneração das instituições, de acordo com o pesquisador. Ele enfatizou que o aspecto relevante não é simplesmente a existência de escândalos e esquemas privados de malversação de recursos públicos, mas "pensar a corrupção como elemento de degeneração e mudança institucional".

Ao analisar os dados de uma pesquisa empírica que ele coordena no Centro de Referência do Interesse Público da UFMG, observou que a corrupção é menos tolerada quando se trata de ações político-partidárias, não afetando tanto as relações privadas. Para ele, pensar o quão sólidas devem ser as instituições para enfrentar as corrupções inerentes ao processo democrático e para que elas, as instituições, não se corrompam, talvez seja o grande desafio para os questionamentos sobre a qualidade da democracia.

LEGITIMAÇÃO
Há um fenômeno crescente, especialmente no mundo ocidental, que é a importância que os tribunais supremos ou órgãos equivalentes vêm adquirindo no processo democrático. A assertiva é do diretor da Escola de Direito do Rio de Janeiro da FGV-RJ, Joaquim Falcão, que vê uma função legitimadora do Judiciário, corroborada pelo acompanhamento por parte do cidadão, via mídia, do "making of" da justiça.

Falcão analisa como um fato inédito no Judiciário brasileiro o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal de temas tão diversos e com repercussão na sociedade como demandas justas e imperativas: união homoafetiva, aborto de anencéfalo, pesquisa com células-tronco, marcha da maconha, demarcação de terras indígenas, cotas raciais e mensalão. "São demandas em que a Justiça não pode simplesmente exercer seu papel em um julgamento mecânico, pragmático", observa.

Segundo ele, o que se evidencia nas relações entre os três Poderes é que a sociedade e a mídia ao demarcarem posições entre elencos de necessidades e demandas variadas permitem avançar para uma sociedade plural onde a liberdade de informação e a transparência das instituições qualificam a democracia em que se quer viver.