Você está aqui: Página Inicial / PESQUISA / Projetos Institucionais / USP Cidades Globais / Ensaios / Reflexões sobre a Contribuição das Instituições de Ensino Superior no Alcance do ODS 5 - Igualdade de Gênero

Reflexões sobre a Contribuição das Instituições de Ensino Superior no Alcance do ODS 5 - Igualdade de Gênero

por Fernanda Rezende - publicado 15/07/2021 11:53 - última modificação 15/07/2021 11:53

Autores: Sandra Dalila Corbari¹, Claudia Terezinha Kniess², Gérsica Nogueira da Silva³

por Sandra Dalila Corbari¹, Claudia Terezinha Kniess²,
Gérsica Nogueira da Silva³

A igualdade de gênero se refere às possibilidades que homens, mulheres, meninos e meninas têm de controlar suas próprias vidas, gozando de direitos iguais, bem como acesso a serviços, educação, saúde, mercado laboral, entre outros. Desde sua fundação, a ONU (Organização das Nações Unidas) tem sido o principal espaço para inclusão de questões relacionadas às mulheres e para a criação de instrumentos internacionais que garantam o respeito a seus direitos. O reconhecimento da igualdade de gênero como princípio fundamental do direito internacional ocorre na fundação da ONU. A Carta da ONU, assinada em 1945, reconhece o princípio de não discriminação com base no sexo e a igualdade entre homens e mulheres. Em 2015, o Relatório dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) apontou algumas evoluções quanto à igualdade de gênero, tendo todas as regiões alcançado a meta de eliminar a disparidade de gênero na educação primária, secundária e ensino superior e na representatividade, inclusive política (ONU, 2015). Não obstante, há muito a ser feito em relação a essa desigualdade. Por isso, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) contemplam a igualdade de gênero no ODS 5, tendo como meta o alcance da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres, possibilitando sua atuação na política, na economia, na educação e em diversas outras áreas. Diferentemente de seu antecessor (ODM), este objetivo foca em alcançar – e não somente promover – a igualdade de gênero. Além disso, inclui objetivos, metas e indicadores que foram deixados de lado na década anterior, e que são fundamentais para reverter a persistente desigualdade de gênero (MENEZES, 2019). A igualdade de gênero não é apenas um direito humano fundamental, mas também é necessária para a construção de um mundo pacífico, próspero e sustentável, como bem afirma a ONU (ONU, 2015).

As instituições de ensino superior desempenham um papel educacional, social, cultural e político relevante para o desenvolvimento da sociedade. Cabe, nesse ponto, compreender como as instituições de ensino superior podem contribuir para o alcance do ODS 5. Em um estudo realizado por Sampaio et al. (2020) - com o objetivo de analisar, discutir e refletir sobre a contribuição da Pós-graduação brasileira na área de avaliação de Ciências Ambientais (CiAmb) da CAPES à sociedade, no processo de incorporação dos ODS – verificou-se que há uma lacuna em relação às pesquisas envolvendo a questão de gênero, sendo que o ODS 5 foi apontado como de menor aderência nas teses e dissertações analisadas. Isso traz à tona que ainda se faz necessário um avanço, mas não apenas em relação às pesquisas, mas no tocante à integração das áreas do conhecimento e dos indicadores para mensuração do impacto do PPG no atendimento aos ODS. O ODS 5 exige medidas que envolvam também o ensino, a extensão e a administração, com ênfase nas políticas e ações afirmativas.

Sobre isso, vale destacar que o Brasil vem progredindo em relação às políticas afirmativas, em especial no ensino superior (nível graduação). No entanto, assim como destacado por Rosemberg e Andrade (2008), a reivindicação por políticas de ação afirmativa no ensino superior tem se referido principalmente aos egressos da escola pública (como indicador de oportunidades econômicas e educacionais), aos negros e aos indígenas. Em que pese esses grupos sociais merecerem destaque no que diz respeito às reparações históricas, a perspectiva das relações de gênero também se faz importante. Conforme os autores supracitados, “nas propostas de cotas para ingresso na universidade, praticamente não há menção à perspectiva do gênero” (ROSEMBERG; ANDRADE, 2008, não p.). Esse é um dos aspectos a serem levados em consideração quando se busca mensurar os impactos na sociedade das instituições de ensino. Nesse sentido, surge o questionamento: como mensurar a contribuição dessas instituições nesse sentido?

O Ranking de Impacto, do Times Higher Education (THE) dá algumas pistas. Esse ranking elenca, por meio de autodeclarações, universidades de todo o planeta quanto ao seu desempenho na implementação dos ODS. No caso do ODS 5, o ranking considera fatores como: i) Proporção da produção total de pesquisa de uma universidade que é de autoria de mulheres; ii) Proporção de artigos sobre igualdade de gênero nos 10% melhores periódicos definidos pela Citescore; iii) Número de publicações sobre igualdade de gênero; iv) Número de mulheres iniciando a graduação e número de mulheres que são a primeira geração de suas famílias a cursarem o ensino superior; v) Políticas e acompanhamento das taxas de inscrição, aceitação e conclusão de estudantes do sexo feminino e incentivo à inscrição em áreas onde as mulheres são sub-representadas; vi) Proporção de mulheres em cargos sêniores; vii) Proporção de mulheres recebendo diploma; viii) Políticas de não discriminação contra mulheres e transgêneros; ix) Políticas de maternidade e paternidade; x) Creches acessíveis a estudantes e funcionários e outras facilidades para cuidado com criança; xi) Esquemas de mentoria feminina; e xii) Políticas de proteção à denúncia contra discriminação.

As métricas utilizadas pelo ranking THE têm forte aderência, principalmente, às metas 5.a “Adotar e fortalecer políticas sólidas e legislação aplicável para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas, em todos os níveis” e 5.1 “Acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres e meninas em toda parte”. No entanto, as demais metas do ODS 5 podem ser contempladas em projetos de pesquisa, de extensão (inclusive por meio de pesquisa-ação) e de projetos institucionais.

No ranqueamento de 2021, a universidade melhor classificada com relação ao alcance do ODS 5 foi a Princess Nourah Bint Abdul Rahman University, da Arábia Saudita. Sendo a maior universidade feminina do mundo, esta instituição tem um importante papel no país, contribuindo para que as mulheres sauditas ganhem notoriedade em nível internacional, inclusive em áreas do conhecimento dominadas por homens, como medicina, informática e gestão. A segunda melhor classificada foi a La Troble University, da Austrália, que tem se dedicado a aumentar a participação e representação das mulheres em todos os níveis, removendo barreiras para a progressão na carreira de mulheres, funcionários não binários e transgêneros e, assim, aumentar a diversidade de gêneros em cargos seniores (em 2020, cerca de 47% dos cargos de liderança eram exercidos por mulheres).

Em 2021, figuram entre as 100 primeiras colocadas no ranking do ODS 5 a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) (89ª) e a Universidade Estadual de Londrina (UEL) (94ª) (THE, 2021). No mesmo ano em que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) anuncia uma atualização na Plataforma Lattes, possibilitando a inclusão de informações sobre licença maternidade pelas pesquisadoras. Ações como esta indicam que o país tem se dedicado à Agenda 2030 e que as instituições de ensino – elo importante na corrente em prol do desenvolvimento sustentável – têm mostrado avanços nesse sentido. Cabe, no entanto, retomar a reflexão anteriormente posta: como mensurar o desempenho/atuação dessas instituições em prol do ODS 5 e dos demais objetivos? Quais produtos, ações e reflexões ainda são necessárias para um maior protagonismo em relação à equidade de gênero? As ações têm contemplado todos(as) de forma igualitária? E, para finalizar, que ações têm sido desenvolvidas no contexto pandêmico, de trabalho e pesquisa desenvolvidos de forma remota?


¹ Docente da Universidade Federal do Rio Grande (FURG)

² Docente da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e da Universidade São Judas Tadeu (USJT)

³Integrantes do GPes-3, pós-doutorandas e pesquisadoras do Centro de Síntese USP Cidades Globais/IEA/USP.


REFERÊNCIAS

MENEZES, H. Z. Os objetivos de desenvolvimento sustentável e as relações internacionais (Org.). João Pessoa: Editora UFPB, 2019.

NAÇÕES UNIDAS (ONU). The Millennium Development Goals Report 2015. ONU: 2015.

NAÇÕES UNIDAS (ONU). Agenda 2030. ON, 2015. Disponível em https://brasil.un.org/pt-br/sdgs.

ROSEMBERG, F.; ANDRADE, L. F. Ação afirmativa no ensino superior brasileiro: a tensão entre raça/etnia e gênero. Cadernos Pagu, n. 31, dez. 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0104-83332008000200018.

SAMPAIO, C. A. C.; KNIESS, C. T.; CORBARI, S. D.; PHILIPPI JR.; SOBRAL, M. C. M. Contribuição da pós-graduação brasileira em Ciências Ambientais na implementação da Agenda 2030. Revista Nupem, v. 12, n. 27, p. 277-299, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.33871/nupem.2020.12.27.277

-299.

TIMES HIGHER EDUCATION (THE). Impact rankings 2020. Disponível em: https://www.timeshighereducation.com/world-university-rankings.

Interface com os ODS: ODS 4, ODS 5, ODS 10