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Os 50 Anos do Ensaio “O Mito do Desenvolvimento Econômico”, de Celso Furtado

por Sandra Sedini - publicado 05/03/2024 10:45 - última modificação 08/04/2024 07:17

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de 11/04/2024 - 15:00
a 11/04/2024 - 17:00

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O ensaio de Celso Furtado “O Mito do Desenvolvimento Econômico” foi publicado em 1974 e logo traduzido em várias línguas, com considerável repercussão. Redigido durante o ano letivo 1973-1974, passado em Cambridge, resultou do exame de relatório que vinha fazendo imenso barulho, havia dois anos: Limits to Growth (1972).

Em seu livro de 1991, Os Ares do Mundo, Furtado lembra que os autores haviam se colocado a seguinte questão: “o que acontecerá se o desenvolvimento econômico, objetivo que buscam todos os povos, vier a ser efetivamente alcançado, ou seja, caso as formas de vida dos povos ricos vierem a ser universalizadas”? (p. 192)

Pareceu-lhe evidente que seria tal a pressão exercida sobre os recursos não-renováveis, a poluição do meio ambiente seria de tal ordem, ou o custo do controle dessa poluição tão elevado, que o sistema econômico mundial entraria inevitavelmente em colapso. “Logo percebi que esse era um raciocínio falacioso, ...” (idem, 193).

Nove análises

No último quarto de século, a visão de Furtado sobre tal “mito” ou “falácia” mereceu ao menos sete análises em artigos acadêmicos (obtenha o PDF clicando no título).

Em 2003, Clovis Cavalcanti publicou “Meio ambiente, Celso Furtado e o desenvolvimento como falácia”, cuja primeira versão, algo distinta, havia sido publicada dois anos antes, como avisa a primeira nota de rodapé.

Em 2011, Julia Mello de Queiroz voltou ao mesmo tema em “Desenvolvimento econômico, inovação e meio ambiente: a busca por uma convergência no debate”, desta vez bem mais preocupada com o “estruturalismo” ou “teoria estruturalista”.

Em 2019, Henrique Ferreira de Souza e Anderson Henrique dos Santos Araújo trataram da questão em âmbito mais geral: “Desenvolvimento e meio ambiente: as contribuições de Celso Furtado”. Também enfatizaram as “condicionantes estruturais” e o “pensamento estruturalista”.

Ainda em 2019, Renato Nataniel Wasques, Walter Luiz dos Santos Júnior e Danilo Duarte Brandão em "As idéias de Celso Furtado sobre a questão ambiental" foram bem mais longe ao defenderem a tese de que Furtado teria sido “pioneiro” ao antecipar as relações “estritas” entre economia e ecologia, num momento em que tal discussão ainda seria “incipiente”.

Em 2021, Alexandre Macchione Saes e José Alex Rego Soares fizeram curta referência ao tema em artigo sobre “Ideias e método de Celso Furtado para pensar o século XXI”. Dizem que “o contínuo esforço de revisão de suas próprias teses e formulações, (...) como também a atenção para as novas agendas de pesquisa e de intervenção política, tal como a questão ambiental desde o grupo de Roma até a Rio 1992, ilustram a atualização do pensamento de Furtado a cada novo contexto” (p. 219).

Também em 2021, Márcia Cristina Silva Paixão (UFPB) e Jorge Madeira
Nogueira (UnB) publicaram capítulo intitulado “Celso Furtado: Lições aos
ambientalistas e aos dependentistas contemporâneos”, no livro "Celso Furtado 100 Anos Coletânea de ensaios em sua homenagem" (UFPB).

Em 2023, Alexandre Macchione Saes começou a aprofundar a análise desta “atenção” de Furtado à “agenda”, ou “questão”, “ambiental”. Em comunicação a congresso, com o título “Celso Furtado e a ressignificação do meio ambiente”, deu início à reflexão apresentada, meses antes, em seminário online

Outros dois textos que – infelizmente -, não estão disponíveis online, também merecem muita atenção:

Em 2005, Carlos Mallorquin analisou o ensaio “O Mito” nas páginas 253-258 de seu livro "Celso Furtado: Um Retrato Intelectual", com apresentação de Carlos Lessa (ed. Contraponto). Nessas seis páginas, a ênfase é para a relação do autor com a teoria weberiana.

Em 2007, Eleutério F. S. Prado publicou “A garganta mitológica da teoria econômica”, como 18º capítulo (p. 395-408) da coletânea Celso Furtado e o Século XXI, organizada por João Saboia e Fernando J. Cardim de Carvalho (ed. UFRJ e Manole). Para o autor, “O pensamento que se opõe ao mito e que busca dele se apartar recai em formulações mitológicas” (p.406).

Dois problemas

Nisso tudo há, ao menos, dois problemas que exigem muita atenção e que justificam a iniciativa desta conversa online do IEA/USP.

Primeiro, o fato de ser anti-evolucionária a imputação de que o desenvolvimento econômico seria mito ou falácia. Tal afirmação só se sustenta se apoiada na ideia restrita e mecânica de que não existem outras vias de desenvolvimento econômico, diferentes da experiência de um punhado de nações do atual “Norte Global”, especialmente nas primeiras sete décadas o século XX. Ou, nas palavras de Furtado: “se a formas de vida dos povos ricos vierem a ser universalizadas

Daí a importância de uma reavaliação da dita “teoria estruturalista” à luz dos posteriores avanços do pensamento econômico. Especialmente os realizados por adeptos de abordagens institucionais, evolucionárias e complexas.

O segundo problema é que, ao contrário do que insinuam as referidas seis contribuições acadêmicas, por trinta anos - entre 1974 e seu falecimento, em 2004 -, Furtado evitou, de forma sistemática, escrever qualquer coisa sobre desdobramentos da celeuma provocada pelo relatório Limits to Growth (1972).

Em seus inúmeros escritos, preferiu manter distância das intensas discussões sobre o “ecodesenvolvimento”. Slogan proposto pelo habilidoso articulador Maurice Strong (1929-2015), que - no período 1972-1987 - foi ardorosamente promovido por Ignacy Sachs (1927-2023), falecido em agosto do ano passado.

O mesmo aconteceu no processo de legitimação do ideal de “desenvolvimento sustentável”, que cada vez mais se consolida como a primeira utopia do Antropoceno. Até aviso em contrário, por doze anos - desde a Rio-92 até sua morte -, Furtado nem chegou a empregar o adjetivo ‘sustentável’ ou o substantivo ‘sustentabilidade’.

De maneira bem informal, ele se pronunciou sobre a “questão ambiental”, em março de 1991. Foi em conversa gravada por Cristovam Buarque, transcrita e comentada no livro Foto de uma conversa (Paz e Terra, 2007). Mesmo assim, em raros momentos, que surgem nas páginas 57-59 e 78-79. “Se deixarmos que continue o atual processo civilizatório, o planeta se destrói” (57).

Frase muito infeliz, que transfere ao “planeta” o que realmente tem a ver com a ‘vida’ (essência de sua delicada biosfera) e que usa o pronome “se”, como se o problema pudesse ser de hipotética autodestruição planetária.

Mais de um ano depois de tal conversa informal, já às vésperas da grande conferência do Rio, Furtado incluiu no livro Brasil: a construção interrompida (1992), um quarto capítulo intitulado “Nova concepção do desenvolvimento”. Nele, surge um alerta sobre a “fatura ecológica a ser paga pelos países que, ocupando posições de poder, se beneficiaram da formidável destruição de recursos não renováveis (...)” (p.77).

Volta à mesma tese – ipsis litteris -, seis anos depois, em capítulo sobre o que deveria ser uma “nova concepção do desenvolvimento”. A ideia de “fatura ecológica” a ser paga tão somente por um pequeno grupo de países, que teriam sido os únicos responsáveis por formidável destruição de recursos naturais, reaparece na página 65 de O Capitalismo Global (1998).

Claro, Furtado não foi o único economista de sua geração a esquivar-se de tais debates ou desviar da relação que existe entre seu ingrediente essencial - o ‘crescimento econômico’ – e seu principal limite, a ‘natureza’. Vários dos assim chamados “economistas do desenvolvimento” parecem ter preferido idêntico ‘afastamento’ da questão. Caso, por exemplo, do tão aclamado Albert Hirschman (1915-2012). Pode não ter sido idêntico ao de Amartya Sen, mas é mínimo o que existe sobre a questão em sua vastíssima obra escrita.

Um objetivo

No essencial, o que se pretende com este evento é só uma coisa: verificar até que ponto os participantes poderão trazer evidências contrárias a tão desfavorável apresentação das ideias de Furtado sobre a dita “questão ambiental”, assim como ao caráter apologético da parca literatura acadêmica já disponível.

Participantes:

Alexandre de Freitas Barbosa (IEB-USP)

Alexandre Macchione Saes (BBM-USP)

Cristovam Buarque (político)

Coordenação e Mediação:

José Eli da Veiga (Programa Professor Sênior)

Transmissão

Acompanhe a transmissão do evento em www.iea.usp.br/aovivo

Inscrições

Evento público e gratuito | Sem inscrição

Evento on-line | Não haverá certificação

Organização