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O oceano no centro da crise climática

por Gabriella dos Santos - publicado 21/10/2025 13:30 - última modificação 29/10/2025 14:18

O seminário “Nexo Oceano-Clima como Propulsor da Sustentabilidade Global”, realizado no dia 16 de outubro, reuniu cientistas, legisladores e iniciativa privada para discutir políticas públicas para a conservação marinha.

Evento reúne cientistas, legisladores e iniciativa privada
para discutir políticas públicas para a conservação marinha

Carlos Nobre - 16/10/2025
O climatologista Carlos Nobre, titular da Cátedra Clima e Sustentabilidade
Por ser o principal regulador climático do planeta, o oceano está no centro da crise global, o que torna sua conservação uma preocupação primordial dos cientistas diante da intensificação das mudanças climáticas. Diante dessa preocupação, a Cátedra Clima & Sustentabilidade (parceria do IEA com a Reitoria da USP) realizou, no dia 16 de outubro, o seminário “Nexo Oceano-Clima como Propulsor da Sustentabilidade Global”.

O encontro foi o sexto e último do ciclo de seminários “Ressignificando o Progresso: Reflexões a Partir das Mudanças Climáticas”. O objetivo dessa vez foi debater os desafios e as demandas de cientistas e legisladores para a elaboração de políticas para a conservação do oceano e com isso auxiliar na regulação do clima global, questão primordial para a COP30, a ser realizada em novembro, em Belém (PA).

Alerta

O sinal de alerta em relação ao oceano é o branqueamento de recifes de corais, causado pelo aumento da temperatura da água. Isso indica a proximidade de se atingir o primeiro dos pontos de não retorno climáticos. O climatologista Carlos Nobre, titular da Cátedra Clima & Sustentabilidade (parceria do IEA com a Reitoria da USP) ressalta a gravidade da situação: “Os recifes de corais mantêm de 18 a 25% de toda a biodiversidade oceânica. Portanto, o branqueamento desses ecossistemas coloca em risco o combate às mudanças climáticas”.

Os pontos de não retorno foram definidos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC, na sigla em inglês) no final de 2018. Uma vez ultrapassados, não será possível o retorno do planeta aos padrões climáticos pré-mudança.

Painel 1 do seminário "Nexo Oceano-Clima como Propulsor da Sustentabilidade Global"
Painel 1 (a partir da esq.): Guilherme Cortez, Jônatas Souza da Trindade Carlos Henrique Andrade de Oliveira e Alexander Turra (moderador)

Oceano como centralidade

Com grande biodiversidade marinha e uma costa marítima de escala continental, a expectativa é que o Brasil promova um debate elevado e esforços significativos de conservação do oceano e adaptação climática. Marinez Scherer, doutora em ciências do mar pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e convidada especial para o Oceano da COP30, expressou estranheza com o histórico de marginalização do tema: “Fico surpresa com o fato de que a importância do oceano ainda não estivesse no cerne das discussões sobre sustentabilidade, uma vez que ele é o principal regulador do clima. Nós temos grande potencial de mudar isso ao debater a relação entre a natureza verde e a natureza azul na COP30”.

Scherer integra o grupo de 20 enviados especiais de diversas áreas do conhecimento e da sociedade civil. O papel deles será auxiliar no cumprimento da Agenda de Ação da COP30, discutindo propostas de solução de Organizações Não-Governamentais da ONU e buscando gerar resultados climáticos concretos com potencial de escalabilidade. "A principal ação que estamos elaborando é um plano de aceleração de soluções para preservação e restauração do oceano e ecossistemas costeiros com base em dispositivos  já existentes”, explicou.

Para somar contribuições ao debate sobre políticas públicas voltadas à sustentabilidade e mitigação, o seminário contou com a participação de representantes do Executivo e do Legislativo paulista, incluindo: Jônatas Souza da Trindade, subsecretário do Meio Ambiente da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil), Carlos Henrique Andrade Oliveira, secretário executivo da Frente Parlamentar Ambientalista da Assembleia Legislativa, e o deputado estadual Guilherme Cortez (PSOL), coordenador da Frente Parlamentar de Combate às Mudanças Climáticas.

A necessidade de pensar em alternativas de conservação oceânica a partir do conhecimento de comunidades tradicionais do Brasil foi um dos aspectos centrais  da discussão. Segundo Cortez, “quando falamos de oceano, é fundamental a participação das comunidades de pequenos pescadores e ribeirinhos, pois eles vêm nos mostrando como é possível se desenvolver economicamente em equilíbrio com o meio ambiente”. O deputado complementou defendendo o controle público sobre os recursos naturais, pois considera que “a privatização é um agravante das mudanças climáticas”.

Painel 2 do seminário "Nexo Oceano-Clima como Propulsor da Sustentabilidade Global"
Painel 1 (a partir da esq.): Denis Moledo de Souza Abessa, Natália Micossi da Cruz, Edmar Moraes, Pedro Saad e Deborah Prado (moderadora)

Soluções e gestão costeira

No segundo bloco, o debate se aprofundou nas soluções e nos mecanismos de gestão. Denis Moledo de Souza Abessa, coordenador do Núcleo de Estudos sobre Poluição e Ecotoxicologia Aquática da Unesp, ressaltou a perspectiva científica. Ele destacou  que os três pilares da crise planetária – perda de biodiversidade, mudanças climáticas e poluição – e a exploração do oceano devem ser abordados em suas especificidades. Afirmou que a preservação dos manguezais e de outros ecossistemas costeiros é essencial para a conservação marinha.

As questões regulatórias e de gestão territorial da zona costeira e marinha foram um ponto relevante no seminário. O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro foi implantado pela Lei nº 7.661/88, que estabelece os limites da zona costeira, os setores costeiros, o sistema de gestão e os instrumentos de políticas. Em paralelo, a Semil tem trabalhado em audiências públicas para a implementação de novas ferramentas, como o Projeto de Lei 582/25 (proposta de uma Lei do Mar, que tem como finalidade promover a conservação e o uso sustentável da diversidade biológica marinha) e o pagamento por serviços ambientais urbanos, considerados essenciais para gerenciar o impacto da vida urbana sobre os ecossistemas marinhos. Além disso, foi citado o trabalho de revisão dos zoneamentos do Litoral Norte de São Paulo e da Baixada Santista, buscando a participação popular.

A necessidade de tornar a discussão sobre mudanças climáticas e a importância do oceano acessível e interessante para a sociedade civil é uma dificuldade recorrente. “A pauta climática sempre foi tratada como um nicho, para pessoas que têm tempo. Nós precisamos apresentar maneiras de mitigação de forma positiva, mostrando as melhorias que um meio ambiente saudável traria para essas pessoas”, argumentou Cortez.

Por fim, o seminário abordou a importância do setor privado e da comunicação como aliados essenciais na aceleração de soluções para a conservação oceânica e a mitigação das mudanças climáticas. Representantes do setor privado destacaram o potencial de parcerias público-privadas para financiar projetos de restauração de ecossistemas costeiros e para desenvolver tecnologias inovadoras, como sistemas de monitoramento marinho e energias renováveis.

Fotos: Leonor Calasans/IEA-USP