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As relações entre tempo e astronomia na Teoria da Relatividade

por Flávia Dourado - publicado 26/05/2015 12:15 - última modificação 10/08/2015 14:49

Hideyo Kunieda, vice-reitor de Pesquisa da Universidade de Nagoya, Japão, falou sobre o tema em conferência da Intercontinental Academia, realizada no dia 21 de abril.
Conferência de Hideyo Kunieda - 21 de abril de 2015
O astrônomo Hideyo Kunieda,
da Universidade de Nagoya

Tempo na Astronomia foi o tema da conferência de Hideyo Kunieda, vice-reitor de Pesquisa da Universidade de Nagoya, Japão, na Intercontinental Academia (ICA), no dia 21 de abril.

Kunieda, que é também professor do Departamento de Física da Universidade, tratou particularmente dos avanços no âmbito da observação de Núcleos Ativos de Galáxia com o auxílio de telescópios de raios X, sua área de expertise.

De acordo com o professor, essa área de pesquisa vem contribuindo substancialmente para a compreensão de fenômenos astronômicos previstos na Teoria da Relatividade, como é o caso da deformação do espaço-tempo na presença de objetos supermassivos, dos buracos negros e da curvatura da luz.

Ecos do passado

"A luz dos corpos celestes que vemos hoje foi emitida há muito tempo. Olhar o espaço é como olhar para o passado", afirmou Kunieda, ressaltando que isso ocorre devido à amplitude da escala do universo: "A propagação da luz no espaço é medida em anos", completou.

Para o professor, um dos pontos positivos desse "atraso" da luz é a possibilidade de estudar a evolução do universo ao longo do tempo, desde o Big Bang até os dias de hoje.

Segundo a teoria do Big Bang, dominante entre os cientistas, o universo foi criado há 13,7 bilhões de anos a partir de uma grande explosão. Planetas, estrelas e galáxias seriam como estilhaços que progressivamente se afastam do centro de denotação, fazendo o universo se expandir continuamente.

"O universo era bastante uniforme logo depois do Big Bang. Mas então os fragmentos aumentaram e as estrelas e galáxias foram criadas. Atualmente estamos olhando para uma grande variedade de objetos", avaliou o professor.

De acordo com ele, observar objetos de luz fraca no espaço, com pouco brilho, é como observar o estágio inicial do Big Bang, quando os estilhaços começavam a tomar forma. "E olhar galáxias distantes é ver como eram as galáxias no início do universo."

A ideia de um universo em movimento e em expansão, que está por trás da teoria do Big Bang, foi fortemente influenciada pela Lei de Hubble, segundo a qual há uma relação entre distância de uma galáxia da Terra e a velocidade com que ela se afasta: quanto mais longe, mais rápida.

A lei foi formulada a partir da observação de um fenômeno conhecido como "desvio para o vermelho", caracterizado pela alteração na frequência das ondas que compõem o espectro de luz em função da velocidade relativa entre o observador e a fonte emissora. Se o objeto se afasta do observador em alta velocidade, as ondas de baixa frequência ficam mais visíveis e sua cor é deslocada para o vermelho; e se o objeto se aproxima, as ondas de alta frequência tornam-se mais nítidas e a cor é deslocada para o violeta.

Verificou-se, assim, que a maior parte das galáxias apresentava um desvio para o vermelho e que, quanto maior esse desvio, maior a distância entre as galáxias e a Terra. "Pela lei de Hubble, o eixo do tempo é convertido em profundidade no espaço", sintetizou Kunieda.

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Buraco negro

Previsto pela Teoria da Relatividade, o desvio para o vermelho também ocorre devido à influência de um campo gravitacional forte. Os estudos de Kunieda sobre os Núcleos Ativos de Galáxia (AGN, na sigla em inglês) baseiam-se na observação desse fenômeno a partir de imagens captadas por telescópios de raio X.

Os AGN são corpos supermassivos e muito luminosos: chegam a ter uma massa 1 bilhão de vezes maior e a ser 100 bilhões de vezes mais brilhantes que o sol.

Segundo o professor, observações astronômicas realizadas a partir de diferentes técnicas sugerem que os AGN abrigam buracos negros — regiões do espaço no qual a gravidade é tão forte que nada, nem mesmo a luz, consegue escapar. Formados a partir do colapso gravitacional de uma estrela, conhecido como supernova, os buracos negros são resultado da curvatura do espaço-tempo, sistema de coordenadas que fundamenta a Teoria da Relatividade.

"Perto de um buraco negro, o espaço-tempo é mais curvo. Por causa disso, o tempo parece mais lento e a luz que vem dele parece mais avermelhada", afirmou Kunieda, fazendo referência ao fenômeno do desvio gravitacional para o vermelho.

Ele explicou que o brilho dos AGN não provêm dos buracos negros em si, que são invisíveis, mas da radiação produzida pelo disco de acreção — aglomerado de partículas e gases que circunda objetos supermassivos. Como apresentam campo de gravidade muito alto, os buracos negros sugam toda a matéria do seu entorno. Ao ser sugada, essa matéria não cai no buraco em linha reta, mas de forma espiralada, como num redemoinho, dando origem a um disco que pouco a pouco acrescenta massa ao objeto central.

De acordo com Kunieda, o calor produzido pelo movimento da matéria em direção ao corpo gravitacional irradia na superfície do disco, essa, sim, visível. O deslocamento para o vermelho acontece devido à atuação da gravidade, que provoca um aumento no comprimento das ondas de luz. Ele afirmou que se trata do fenômeno da curvatura da luz sob o efeito da gravidade, tal como previsto na Teoria da Relatividade.

As observações do professor voltam-se justamente para os discos de acreção no centro das galáxias hospedeiras. De acordo com ele, imagens obtidas por ele e outros pesquisadores apontam para a existência dos objetos supermassivos — no caso, de buracos negros — conforme determina a Teoria da Relatividade.

Via Láctea

Na avaliação de Kunieda, imagens da própria Via Láctea oferecem evidências de que os buracos negros existem. Obtidas a partir de radiação infravermelha ou raio X, as imagens a princípio mostram uma galáxia comum, sem um objeto central brilhante e, portanto, desprovida de um núcleo ativo.

No entanto, ressaltou o professor, uma nuvem de partículas em uma das extremidades da galáxia apresenta um padrão de luminosidade incomum, como se fosse iluminada de baixo para cima e refletisse a luz emitida por um objeto no entorno. De acordo com ele, trata-se do que os astrônomos denominam como "nebulosa de reflexão".

"Pela distância entre o reflexo e a fonte de luz, é possível calcular há quanto tempo a luz foi emitida. O centro da galáxia foi 10 milhões de vezes mais luminoso há 350 anos", disse, destacando que a nebulosa de reflexão oferece indícios de que o centro da Via Láctea já foi um AGN.

"É um tipo de arqueologia na astronomia. Nós podemos olhar para o passado da atividade do centro da galáxia", comparou. "Nesse caso, o eixo do tempo é convertido numa distribuição bidimensional."

Supernova

Segundo Kunieda, a observação das supernovas, explosões que marcam o início da morte das estrelas, também vem contribuindo para a compreensão da história do universo.

O professor explicou que as estrelas, assim como o sol, são brilhantes devido à fusão nuclear do hidrogênio em hélio, processo que resulta na perda de massa e na formação de um núcleo cada vez mais denso.

Quando o combustível acaba, o núcleo da estrela se contrai e se transforma num objeto maciço, com um campo gravitacional extremamente forte. A estrela passa, então, a atrair toda a matéria para o seu centro, até o ponto em que a alta densidade se torna insustentável e o corpo supermassivo colapsa, expandindo a matéria numa grande explosão, a supernova. O que resta desse colapso dá origem aos buracos negros.

Kunieda ressaltou que "os registros dessas explosões são muito úteis para entender a evolução das remanescentes da supernova que nós vemos atualmente". As remanescentes são nebulosas formadas pelo material ejetado no colapso gravitacional, que se afastam do núcleo em alta velocidade. "Nesse caso, o eixo do tempo é convertido em uma distribuição bidimensional de intensidade", concluiu.

Foto: Leonor Calazans/IEA-USP