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Matthew Kleban discute a flecha do tempo e a evolução do Universo

por Mauro Bellesa - publicado 23/04/2015 14:05 - última modificação 21/03/2016 10:17

O físico teórico Matthew Kleban foi o primeiro conferencista do eixo tempo Tempo da Intercontinental Academia, no dia 20 de abril.
Matthew Kleban
O físico teórico Matthew Kleban, da New York University

A primeira conferência da Intercontinental Academia (ICA) sobre o eixo temático Tempo, no dia 21, discutiu o que se sabe da história e do possível futuro do Universo e o conceito de "flecha do tempo", que prevê apenas uma direção para o transcorrer do tempo, considerando que o passado e o futuro são diferentes, concepção intimamente ligada à cosmologia.

O conferencista foi o físico teórico Matthew Kleban, da New York University, Estados Unidos, que se dedica ao estudo da teoria das cordas e à história do início do Universo.

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Ele comentou que, ao contrário do suposto na flecha do tempo, há leis físicas que preveem uma dupla direção, com uma simetria entre passado e futuro, mas ressaltou que essa ideia ainda é muito confusa para os físicos.

Entropia

Segundo ele, se isso for correto, a diferença entre passado e futuro deve estar relacionada "a um aspecto 'ambiental', um acidente da história, como a diferença entre as Américas do Norte e do Sul, mas universal, aplicável em qualquer lugar e em qualquer momento".

Quando a entropia ('desordem') é pequena ela tende a aumentar e a direção do seu crescimento define o futuro, disse Kleban. Dessa forma a entropia, que era muito pequena no início do Universo, é o fator "ambiental" para a diferença entre o passado e o futuro. "Todavia, nada impede que a flecha do tempo tenha um movimento reverso em razão de algum outro aspecto 'ambiental'".

Cosmologia

Ao falar da cosmologia, ele primeiro definiu o que é essa ciência: "O ramo da astrofísica que estuda a estrutura do Universo nas maiores escalas acessíveis; isso inclui o estudo do nascimento, da morte (ou do futuro) e da evolução do Universo ao longo do tempo".

Entretanto, como o Universo tem 14 bilhões de anos, só podemos ver uma parte dele, ainda que vastíssima, correspondente à distância percorrida pela luz nesses 14 bilhões de anos, comentou. "Ao observar o passado, vemos que o Universo era mais quente e opaco há 14 bilhões de anos, por isso não podemos ver (ao menos diretamente) seu nascimento".

Na sequência de sua apresentação, Kleban tratou do conteúdo atual do Universo. Disse que existem cerca de 100 bilhões de galáxias, cada uma com centenas de bilhões de estrelas; na Via Láctea, há em torno de 300 bilhões de estrelas e seu centro é ocupado por um gigantesco buraco negro, chamado Sagittarius A*, com massa equivalente a 4 milhões de sóis, mas com raio (previsto em teoria) de apenas 17 vezes o tamanho do Sol. O sistema solar também orbita o centro da galáxia, mas sua orbita dura 200 milhões de anos.

A Lei de Hubble

Esse painel sobre as galáxias no Universo foi utilizado por Kleban para introduzir seus comentários sobre a expansão do Universo. O personagem central no caso foi o astrônomo americano Edwin Hubble (1989-1953), que nos anos 20 possuía um telescópio capaz de observar cerca de 50 galáxias (o Telescópio Hubble, em órbita na Terra há 25 anos, permite observar 10 mil galáxias ao apontar para uma fração de 10 milionésimos do céu).

Kleban explicou que Hubble notou algo estranho nas galáxias: quanto mais longe uma galáxia estava, mais rápido ela se afastava da Terra. Essa observação levou à chamada Lei de Hubble: v = Hd, onde H é uma constante com unidades 1/tempo. Com essa lei foi possível calcular quando todo o conteúdo do Universo estava junto: há 14 bilhões de anos.

Em seguida, Kleban inverteu a flecha do tempo, como se a história do Universo caminhasse para trás, desde quando as galáxias eram apenas gás, passando pelo aquecimento cada vez maior, a opacidade, a nucleossíntese de prótons e nêutrons de hélio e lítio, a inflação (quando o volume do Universo cresceu de forma extraordinária em uma fração ínfima de segundo), até chegar à chamada singularidade, "onde até mesmo a simples especulação desmorona".

Ele ressaltou que cada uma dessas fases do Universo produziu enorme entropia e que mesmo atualmente ela está crescendo. "A vida pode ser vista como um processo que acelera a produção de entropia, assim como estrelas e buracos negros fazem isso ainda mais."

As observações de Hubble sobre a expansão do Universo criaram um profunda e estranha ideia: algo como se a Terra fosse o centro do qual tudo se afasta, uma espécie de retomada do geocentrismo de Ptolomeu.

Relatividade

Kleban explicou que em 1916, dez anos antes das observações de Hubble, Albert Einstein (1879-1955) criara a teoria da relatividade geral, uma sequência da teoria especial da relatividade (1905), que unificara tempo e espaço (e energia e momento). "Na teoria da relatividade de Einstein, o tempo é relativo, transcorre mais devagar para um objeto se movendo em alta velocidade ou imerso num campo gravitacional. Mas mesmo na relatividade o tempo não transcorre de forma inversa".

Segundo Kleban, a relatividade geral é uma teoria da gravidade e também uma reformulação radical da natureza do espaço e do tempo, que se tornam intimamente conectados e dinâmicos. Assim, a aparente força da gravidade deixa de ser uma força comum, tornando-se algo como uma "pseudoforça" ou "força fictícia".

Após detalhar algumas implicações disso, inclusive a curvatura do espaço-tempo, Kleban explicou porque a Lei de Hubble funciona: "É por que o Universo está se expandindo, e isso apresenta implicações para o passado e o futuro."

No caso do futuro, alguns acreditam que a expansão continuará infinitamente, com a velocidade diminuindo gradativamente, mas sem parar. Nessa hipótese, explicou o conferencista, as estrelas acabariam por queimar todo seu combustível e o Universo se tornaria frio e morto, mas isso provavelmente não seria o fim, que ocorreria mais tarde.

Outros pesquisadores pensam que a expansão atingirá um nível máximo e depois o Universo se contrairá. Após um tempo finito, a densidade será infinita, numa singularidade que é chamada de Big Crunch (grande esmagamento).

Há também quem considere a possibilidade de uma situação limítrofe entre as duas hipóteses.

No entanto, explicou Kleban, há duas surpresas relacionadas a essas hipóteses: a primeira é que nos últimos bilhões de anos a expansão do universo tem se acelerado, devido à energia escura. A segunda é que a velocidade dessa expansão parece estar muito próxima da velocidade da situação limítrofe. Isso significa, segundo Kleban, que o Universo continuará a se expandir para sempre, mas sem atingir zero grau nem uma verdadeira morte quente.

Multiverso

E quanto ao início de tudo, o Big Bang? Kleban disse que "algumas adições bem-intencionadas às leis físicas podem afetar dramaticamente a natureza do Big Bang e remover a singularidade, sem alterar nenhum experimento realizado na Terra".

Um de seus maiores interesses é o chamado "multiverso" da teoria das cordas. "Na teoria das cordas, o Big Bang não foi uma singularidade nem o início do tempo. Foi o nascimento de uma 'bolha' de uma nova 'fase'". O multiverso comportaria o surgimento de inúmeras bolhas.

Com a teoria das cordas, é possível entender o que havia antes do Big Bang e o que existe "fora do Universo" (na verdade, fora da bolha visível onde a parte observável está inserida), de acordo com Kleban. Entretanto, ele ressalvou que a teoria não funciona em Big Crunches (devido à flecha do tempo, na verdade) por ela previstos. "A teoria também não funciona em situações de baixa entropia."

Concluindo, Kleban disse que para ele a ideia mais atraente é a de um Universo em média sem tempo, com quase todo o tempo em equilíbrio com uma entropia quase máxima, havendo raras flutuações da entropia para baixo, o que produz uma flecha do tempo local. No entanto, "essa ideia parece não funcionar, mas predizer milagres".

Foto: Sandra Sedini/IEA-USP