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Cátedra Olavo Setubal terá 3 mulheres indígenas como titulares em 2024

por Mauro Bellesa - publicado 24/01/2024 10:55 - última modificação 19/02/2024 11:25

As artistas e ativistas indígenas Arissana "Pataxó" Braz, Francy Baniwa e Sandra Benites serão as titulares da Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciência em 2024.

O Comitê de Governança da Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciências escolheu para a titularidade de 2024 três mulheres indígenas que se destacam nas artes, educação, ecoagricultura, pesquisa antropológica e defesa da cultura e direitos dos povos indígenas. Arissana Pataxó, Francy Baniwa e Sandra Benites irão liderar o programa "Caminho da Cutia: Territórios e Saberes das Mulheres Indígenas". A tríade substituirá a escritora e professora Conceição Evaristo, titular em 2022 e 2023.

A escolha das três revestiu-se de caráter comemorativo, uma vez que em abril terá início o 10º ano de existência da cátedra. O Comitê de Governança entende, em consenso, que essa titularidade terá "alta probabilidade de impacto, na universidade e na sociedade, ao ser formada por jovens lideranças femininas oriundas de povos originários - temática ainda não contemplada nas titularidades anteriores -, a partir da composição de um trio de mulheres indígenas de diferentes regiões do país".

O diretor do IEA, Guilherme Ary Plonski, e o coordenador acadêmico da cátedra, Martin Grossmann, integrantes do comitê, manifestaram que, "sempre em consonância com as políticas universitárias e dinâmicas sócio-culturais glocais", a titularidade das três precisará investir em diálogos, interações e ações que "contribuam para um frutífero diálogo e intercâmbio entre a Universidade e os saberes e cosmovisões de povos originários do Brasil".

Os dois destacaram o entusiasmo dos dirigentes da cátedra com a titularidade deste ano, que "certamente trará à USP novos desafios e a possibilidade de qualificar ainda mais, interna e externamente, sua interação com a diversidade multicultural do Brasil".

Arissana "Pataxó" Braz

Arissana Pataxó

Pertencente à etnia pataxó, Arissana nasceu em Porto Seguro (BA) e é artista visual, professora e pesquisadora.  É doutoranda em artes visuais na Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde obteve o título de mestre em estudos étnicos e africanos e graduou-se em artes visuais.

Sua produção artística está relacionada à sua convivência familiar, com seu povo e com outros povos indígenas. Ela utiliza várias técnicas e suportes para tratar da realidade indígena e de sua interação outras realidades contemporâneas.

Arissana costuma dizer que suas primeiras referências artísticas surgiram a partir de memórias da infância "às margens do rio".  Aos 16 anos, mudou-se para a aldeia urbana de Coroa Vermelha.

Ela realizou sua primeira exposição individual ("Sob Olhar Pataxó") em 2007, no Museu de Arqueologia e Etnologia da UFBA. Desde então, participou de diversas exposições no Brasil, Portugal, Noruega, Reino Unido e Estados Unidos.

Arissana atua na educação escolar indígena desde 2002, colaborando também com a formação de professores e a produção de materiais didáticos. Ao longo de seus estudos, desenvolveu atividades de extensão de arte-educação com seu povo e outros povos indígenas da Bahia.

Francy Baniwa

Francy Baniwa (Francineia Bitencourt Fontes)

Integrante da comunidade Wanaliana, na Terra Indígena Alto Rio Negro, em São Gabriel da Cachoeira (AM), Francy é antropóloga, escritora, fotógrafa e cineasta. Atua há mais de uma década no movimento indígena do rio Negro.

É doutoranda em antropologia social na UFRJ, onde obteve o título de mestre na mesma área. Graduou-se e licenciou-se em sociologia na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Em suas pesquisas, busca relacionar os saberes ancestrais de seu povo com as teorias acadêmicas. Dedica-se às áreas de etnologia indígena, mitologia, conhecimentos tradicionais, fotografia e audiovisual.

Francy dirigiu o documentário "Kupixá Asui Peé Itá — A Roça e seus Caminhos", de 2020, e escreveu, em parceria com seu pai, Francisco Baniwa, o livro "Umbigo do Mundo" (2023), ilustrado por seu irmão, Frank Baniwa.

Ela coordenou o Departamento de Mulheres Indígenas do Rio Negro da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro e o projeto "Vida e Arte das Mulheres Baniwa: Um Olhar de Dentro para Fora", no âmbito de acordo de cooperação técnica entre a Funai e a Unesco. O projeto foi retomado em 2023 com vista a qualificar as peças do primeiro acervo indígena da Funai, produzir uma exposição virtual e publicar um catálogo fotográfico e documentários sobre roça, cerâmica e tucum (artesanato com fibra de palmeira de mesmo nome nativa da Amazônia).

No momento, Francy coordena também o projeto ecológico pioneiro Amaronai Itá – Kunhaitá Kitiwara, para a produção de absorventes de pano, com a finalidade de possibilitar dignidade mestrual e empoderamento das mulheres do território indígena alto-rio-negrino.

Sandra Benites - 2023Sandra Benites

Nascida na Terra Indígena Porto Lindo, em Japorã (MS), Sandra é antropóloga, curadora de arte, educadora e ativista do povo guarani nhandeva. Atualmente é diretora de Artes Visuais da Fundação Nacional de Artes (Funarte).

Sandra obteve seu diploma no curso de Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica da Universidade Federal de Santa Catarina. É mestra em Antropologia Social pelo programa de pós-graduação do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com trabalho em que confere protagonismo às histórias coletivas das mulheres indígenas, jogando luz sobre as narrativas e o modo de “caminhar no mundo” (guata) das mulheres Guarani Nhandewa. Desde 2019 vem desenvolvendo pesquisa de doutorado na UFRJ.

Foi professora de arte de ensino fundamental na comunidade guarani de Aracruz (ES), coordenadora pedagógica na Secretaria de Educação em Maricá (RJ) - assessorando escolas indígenas -, curadora adjunta de Arte Brasileira no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp) - onde participou da exposição "Histórias Brasileiras" - e curadora do Museu de Culturas Indígenas de São Paulo.

Realizou a curadoria das exposições “Dja Guata Porã: Rio de Janeiro Indígena”, no Museu de Arte do Rio (MAR), e “Sawé”, organizada no Sesc Ipiranga, em São Paulo (SP). Também foi curadora, em parceria com a artista Salissa Rosa, da exposição "Nhe'ẽ Se", na Caixa Cultural de Brasília (DF).

Suas propostas curatoriais enfatizam cosmovisões indígenas e estão centradas no protagonismo das mulheres indígenas. Nas áreas de educação e pesquisa, dedica-se às problemáticas do ensino bilíngue indígena e à dificuldade desse ensino em abarcar as particularidades e identidade das comunidades guaranis. Benites também se destaca na defesa dos direitos dos indígenas, especialmente no que se refere à educação dos guaranis e à demarcação de seus territórios.

Ela lecionou em várias instituições americanas, entre as quais as Universidades de Indiana, Tufts e Harvard, e teve trabalhos publicados nos sites do Hammer Museum da Universidade da Califórnia em Los Angeles, do Museu de Arte Moderna (MoMa) de Nova York e do Peabody Museum da Universidade Harvard.

No final de 2022 e início de 2023, ela e a artista Anita Ekman foram as curadoras da exposição "Ka'a Body: Cosmovision of the Rainforest", organizada por parceria entre as galerias Paradise Row, de Londres, e Radicants, de Paris. Nesse trabalho, elas examinaram como as mulheres na arte contemporânea indígena e brasileira estão transformando a imaginação global sobre as florestas e seus habitantes, humanos e não humanos.

Fotos (a partir do alto): Jussimar Guedes; Idjahure Terena; e Rodrigo Avelar