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IEA e Ieac-Unifesp discutem gestão e futuro da universidade

por Matheus Nistal - publicado 08/12/2022 19:15 - última modificação 09/12/2022 11:10

Evento motivado pelo lançamento de livros sobre a USP e a Unifesp projeta futuro e avalia o passado das universidades

As universidades são entes em profunda e constante transformação, diferentemente do que muitos imaginam. "Nós somos mais um 'fluxo' do que um 'estoque'", refletiu Guilherme Ary Plonski, diretor do IEA, durante o evento "O Futuro da Universidade: Desafios e Perspectivas", realizado em 6 de dezembro.

Organizada pelo IEA e Instituto de Estudos Avançados e Convergentes (Ieac) da Unifesp, a atividade fez um balanço sobre as mudanças recentes na gestão das universidades públicas e os desafios que ela enfrenta, e foi motivada pelo lançamento de dois livros em 2022 – "USP - Novos Tempos, Novos Olhares" e "Por dentro da Gestão Plural e Democrática da Unifesp", de autoria de Andrea Rabinovici, Pedro Fiori Arantes e Soraya Soubhi Smaili. As obras retratam dois grandes polos de conhecimento que atuam no mesmo território. Ambas públicas, sendo uma estadual e outra federal.

A diferença entre os entes federativos é basilar para entender os caminhos que as gestões das universidades conseguem tomar. Na avaliação de Plonski, os orçamentos das universidades federais têm dependência das "tempestades dos governos".

Para Marcílio Alves, diretor executivo da Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo (FUSP) e um dos organizadores do livro que trata da USP, o fato das verbas das universidades estaduais paulistas estarem atreladas ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dá certa robustez e previsibilidade orçamentária. Por outro lado, a federação usa outros mecanismos menos estáveis para financiar o ensino superior público.

Marcílio mostrou que, no livro, os autores questionam como serão as universidades no futuro, em particular a USP: projetam academias mais abertas e autônomas, que operem como uma força a favor de mudanças sociais, com uma rede que conecta países, comunidades e projetos comuns de maneira holística e transdisciplinar. Outra questão trazida é a direção para qual as universidades caminham. "No sentido de uma privatização e acirramento do caráter elitista, com uma USP menor para obter os melhores resultados? Ou uma USP mais ampla e democrática, cada vez mais inclusiva e sintonizada com as melhorias sociais da sociedade brasileira".

Para o diretor da FUSP, uma gestão universitária feita por docentes, com excesso de burocracia e dificuldade de execução orçamentária, é algo que precisa ser repensado na USP. Ele defende mais investimento em moradia e alimentação estudantil, e comenta que a universidade não encarou ainda esse problema com coragem, afirmando que com mais de 100 mil alunos, a moradia fornecida atende apenas algumas centenas de pessoas.

Outro ponto tocado por Marcílio foi o acesso à graduação. Segundo ele, a USP entrou atrasada nesse debate, mas, depois da conquista das cotas na graduação, hoje já se discute a implementação da política pública na pós-graduação e na contratação de professores. Plonski cita como avanços algumas medidas da nova gestão da USP, como a introdução da inovação como atividade finalística da universidade e a criação da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento.

A experiência da Unifesp

Ivo da Silva Júnior, presidente do Ieac, defendeu que "a universidade que não se democratiza se fossiliza". Segundo Soraya Smaili, foi com esse foco que a Unifesp foi gerida enquanto ela e outros reitores recentes estiveram no cargo. A ex-reitora relembrou da greve pela qual a Unifesp passou em 2012 que, além de reivindicar melhores condições de estudo, também revelava uma "crise de identidade". Naquele momento a universidade tinha um campus já  consolidado na cidade de São Paulo, a antiga Faculdade Paulista de Medicina, ao mesmo tempo que iniciava sua expansão pela capital e outras cidades. Segundo Soraya, as distintas realidades faziam os estudantes questionar: "Qual universidade estamos construindo?".

Com crescimento acima da média nacional, as gestoras da Unifesp iniciaram um profundo diálogo com o corpo discente, aumentaram as iniciativas de cultura e extensão, e também criaram programas e unidades em conjunto com movimentos sociais. Isso tudo com forte participação das mulheres, que ocupavam mais de 70% dos cargos de liderança.

O Futuro da Universidade - 06/12/2022
Soraya Smaili e Andréa Rabinovici, ex-reitoras da Unifesp, e Gabriela de Brelaz, relatora do evento
A vice-reitora na época, Andréa Rabinovici, relatou durante o seminário o longo processo de escuta e diálogo por parte da reitoria para atender às reivindicações dos estudantes. "Havia um momento em que eu conhecia pelo nome todas as pessoas trans que tínhamos na universidade, de tanto que conversamos para delinear a política", relata. Inicialmente, as reivindicações dessa população eram principalmente o nome social nos diplomas. Hoje, a universidade avançou tanto nesse tema que fez eventos, disponibilizou remédios em laboratório e criou uma política de pronomes neutros, entre outras conquistas, contou Andréa.

Pedro Arantes afirmou que durante a implementação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), em 2007, houve falta de planejamento "gritante" por parte do governo, mas isso abriu novas oportunidades. Ele mostrou que a sua universidade passou por um crescimento vertiginoso em dez anos: de cinco para 58 graduações e de um para sete campi. "Nenhuma universidade aumentou mais do que a nossa." Segundo ele, isso ocorreu em outras escalas no Brasil todo, com pluralidade e diversidade, mas também com problemas.

Arantes relata que houve um crescimento econômico acelerado no país e vontade política de agentes políticos para o aumento de vagas universitárias e construção de campi. Existia tanto ímpeto que, por vezes, as gestões das universidades ficavam escanteadas dos debates e decisões, em detrimento de prefeituras que ensejavam "ganhar um campus". Também há, segundo ele, relatos de entes federativos que designaram terrenos para construção de prédios universitários dentro de unidades de proteção ambiental.

Apesar disso, também elogiou o programa por interiorizar as universidades e abrir espaço para uma nova juventude. Após os últimos sete anos de redução de investimentos,  o novo governo federal deveria inaugurar uma nova época na gestão do  ensino superior público, defendeu o professor. "Agora estamos em um momento de reconstrução, que é também uma revisão da expansão."