Negowat: nova ferramenta para negociações ambientais
Desde o início de 2003, uma equipe internacional de pesquisadores está desenvolvendo uma nova ferramenta para auxiliar na negociação de conflitos sobre água e ocupação do solo na Bacia do Alto Tietê. Os pesquisadores integram o Projeto Negowat, que utiliza a modelagem computacional multi-agente e jogos de papéis entre os envolvidos nos problemas da região. O mesmo tipo de trabalho está sendo feito em Cochabamba, Bolívia. (Veja o site oficial do projeto: www.negowat.org.)
O Negowat (sigla para "Facilitating Negotiations over Water Conflicts in Latin-American Periurban Upstream Catchments: Combining Multi-Agent Modelling with Role Game Playing") é coordenado pelo Centre de Coopération International en Recherche Agronomique pour le Développement (Cirad), da França. Os parceiros da instituição francesa são: IEA, Natural Resources Institute (Reino Unido), Instituto de Economia Agrícola da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios, Núcleo de Estudos Agrários da Faculdade de Economia da Unicamp, Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais, Centro Andino para la Gestión y el Uso de Agua da Universidad Mayor de San Simón (Bolívia) e Centro de Estudios de la Realidad Económica Social (Bolívia). O projeto é financiado pela Comissão Européia e pela Fapesp.
A coordenadora do Negowat é a pesquisadora francesa Raphaèle Ducrot, do Cirad. Ph.D. em agronomia e especialista em modelagem multi-agente, ela trabalha sobretudo com problemas de gerenciamento de processos de decisão em sistemas de irrigação.
Há três problemas centrais no gerenciamento da Bacia do Alto Tietê, segundo Ducrot: 1) melhoria da qualidade da água e proteção dos recursos, especialmente nas nascentes; 2) adequação dos recursos hídricos versus a demanda num contexto de crescimento populacional e aumento das tensões; 3) gerenciamento das inundações. A ferramenta a ser elaborada pelo Negowat será testada em casos ligados a esses problemas tanto na cabeceira do rio Tietê quanto na Represa Guarapiranga e nas proximidades de Cochabamba, Bolívia.
A modelagem multi-agente é uma nova forma de representação computacional desenvolvida a partir do final dos anos 80 e que utiliza a chamada linguagem orientada a objetos. Segundo Ducrot, isso tem sido utilizado nos últimos 10 anos na indústria, nos robôs, no controle de tráfego aéreo em aeroportos e na análise do trânsito urbano, entre outros casos. Nos últimos passou a ser utilizada em centros de pesquisa para gestão de recursos naturais.
A pesquisadora explica que o interesse nesse tipo de modelagem deve-se ao fato de ele possibilitar um modelo muito aberto e permitir representar, simultaneamente, fenômenos biofísicos e sociedades virtuais, onde agentes representam seres humanos, com comportamentos básicos como a possibilidade de tomar decisões, ter uma representação do ambiente e dos outros, de se comunicar e de agir. Entretanto, ela considera que esses modelos são bons para representar sistemas complexos, mas não são adequados para fornecer previsões: “São mais interessantes para ajudar os atores a discutir a partir de cenários possíveis”.
“Não tenho certeza se uma representação muito complexa de um sistema ajude na tomada de decisão, por isso nossa primeira hipótese é trabalhar com um modelo muito simples. O importante é que os atores concordem com a representação feitas sobre eles”, comenta Ducrot. A modelagem será refeita até que todos concordem com a forma com estão sendo retratados. Feito isso, acontecerão os jogos de papéis entre os envolvidos no problema. “Outra vantagem de articular a modelagem multi-agente com o jogo de papéis é que a modelagem é fechada, depois da concordância com as representações, enquanto o jogo de papéis é aberto, com as pessoas podendo propor outros enfoques e posturas.”
Exemplos de casos possíveis são os conflitos que podem surgir com agricultores, que podem alegar não concordar em pagar pela água que ajudam a conservar. Outro caso pode ser a negociação entre municípios que possuem recursos hídricos abundantes mas não os consomem e os municípios que usufruem desses recursos. Outra possibilidade é a situação das invasões de áreas de mananciais por loteamentos irregulares.
Foto: Sabesp