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O tempo e a avaliação do valor da vida

por Sylvia Miguel - publicado 30/03/2016 15:58 - última modificação 30/03/2016 15:58

Uma nova arquitetura capaz de influenciar reações foi tema de palestra da ICA durante os workshops de Humanidades e Ciências Sociais, no dia 10 de março.
Takehiro Ohya

Takehiro Ohya fala das implicações da arquitetura no campo jurisdicional.

Em casos de acidentes graves ou mortes, muitas vezes os familiares da vítima desejariam voltar o tempo para evitar o ocorrido. Mas, e se, em vez de voltar o tempo, as sociedades e suas instituições pudessem contar com ambientes capazes de evitar o erro, ou induzir ao acerto?

A proposta já existe na chamada arquitetura de escolha (choice architecture), um conceito apresentado no dia 10 de março pelo professor Takehiro Ohya, da Keio University, durante os workshops de Humanidades e Ciências Sociais da Intercontinental Academia (ICA).

Realizada em Nagoya, Japão, de 618 de março, a segunda fase da ICA reuniu cientistas de diversas áreas e 13 jovens pesquisadores selecionados para desenvolver estudos sobre o tema “tempo”. O conteúdo das pesquisas subsidiará os estudos dos jovens participantes da ICA na criação de um Massive Open Online Course (Mooc), que será disponibilizado gratuitamente na plataforma Cousera.

Professor de jurisprudência e especialista em filosofia do direito, Ohya mostrou na palestra Time institutionalized and its transformation alguns conceitos de controle social aplicados ao ambiente construído. Trata-se de um tipo de arquitetura teorizada por Lawrence Lessig, professor de direito na Harvard University e criador das licenças Creative Commons, da internet.

A arquitetura de escolha trata de como as decisões são influenciadas pela maneira como as escolhas (coisas) são apresentadas. Essa arquitetura pode ter um viés paternalista ou paternalista libertário, conforme Ohya.

Barras que forçam a caminhar em determinado local ou direção, barreiras no metrô, ou poltronas que não permitem deitar em aeroportos são exemplos da arquitetura de escolha do tipo paternalista porque não dão opção à pessoa, citou Ohya.

Por outro lado, uma lanchonete poderia tornar mais acessíveis e mais visíveis os alimentos saudáveis, em detrimento dos industrializados. Nesse caso, embora o ambiente tenha uma intervenção influenciando “positivamente o cidadão no sentido de ajudá-lo a realizar uma ação para seu próprio benefício”, os indivíduos não são impedidos de comer o que quiserem. O arranjo das escolhas alimentares tem o efeito de diminuir o consumo de “junk food” e aumentar o de alimentos saudáveis, disse.

De acordo com o professor, há quatro forças principais que exercem controle nas grandes sociedades. São elas, a lei, as convenções sociais ou tradições e religiões, o mercado e, mais recentemente, a arquitetura.

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Vídeo:

Time institutionalized and its transformation

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O ambiente físico influencia as decisões porque a disposição das coisas ou as estruturas construídas podem provocar reações no uso de determinado local, explicou Oyha.

A arquitetura de escolha se baseia no fato de que agimos intuitivamente, ou heuristicamente, e nem sempre nos comportamos como agentes racionais, disse Ohya. Na teoria econômica, o agente racional pode ser um indivíduo ou uma firma que toma decisões tendo em vista suas preferências e o uso eficiente da informação. O objetivo é racionalizar suas decisões, seja para maximizar custos, produção, materiais ou outras ações.

O controle social exercido por meio de leis ou regras é uma ação posterior e pode haver quem não seja passível de ser controlado por leis e regras, por exemplo, deficientes mentais ou físicos, disse Ohyo. “Por outro lado, é possível argumentar que a arquitetura poderia controlar até mesmo cães e gatos. Mas também pode não ter efeito em casos muito específicos”, disse o professor.

No controle social exercido pela arquitetura, não há assimetrias antes ou depois da ação. Ela funciona independente da idade, desde que as condições sociais permaneçam as mesmas. No exemplo do acidente grave ou perda de vida humana, em termos de compensação financeira, a legislação da maioria dos países avalia o valor da vida de acordo com a idade e capacidade de produzir riquezas que a pessoa ainda teria ao longo da vida. Por isso, nesse caso, a lei é assimétrica e limitada.

“Quanto mais jovem e quanto mais você ganha, mais você vale. Significa que a vida de uma dona de casa, ou de um operário, de um idoso ou de um deficiente, não tem valor? Nesse novo modelo de controle social, a assimetria de tempo pode desaparecer”, disse Ohya.

Foto: IAR/Nagoya