Reportagem publicada pelo Jornal da USP em 27/2/24, com texto de Ivan Conterno (estagiário orientado por Luiza Caires) e arte de Carolina Borin (estagiária orientada por Moisés Dorado) - Veja a versão original |
Grupo de pesquisa cria banco de dados que reúne medidas anatômicas dos humanos primitivos e defende hipótese de que nossa espécie tem uma origem única no continente africano
Centenas de milhares de anos antes dos primeiros Homo sapiens surgirem, espécies humanas muito diferentes de nós já viviam na Europa e na Ásia dominando o fogo e instrumentos primitivos. Nessa época, ao menos três espécies derivadas do Homo erectus, os primeiros hominínios a ocuparem territórios asiáticos, habitavam o mundo: na África viviam os Homo bodoensis; na Europa, os Homo heidelbergensis; e, na Ásia, os Homo daliensis.
A chegada dos humanos modernos ao Oriente Médio ocorreu há 180 mil anos. Na Europa, a chegada da nossa espécie há 50 mil anos coincide com o declínio da população de neandertais. Aos poucos, os Homo sapiens também substituíram as espécies humanas do Leste Asiático, como o Homo daliensis e o Homo longi.
De todo modo, Maria Helena Senger lembra que não existe uma espécie mais evoluída que outra.
“Não é porque nós sobrevivemos que somos mais evoluídos que outras espécies. Não existe um pico de evolução, em direção ao ótimo. Nós apenas temos sorte de sermos selecionados. É uma seleção quase aleatória”. Para a biologia, a evolução é apenas uma adaptação ao ambiente. “Os neandertais não eram necessariamente uma espécie mais primitiva”, reforça a estudante.
Ainda não se sabe se os sapiens daquela época foram ou não responsáveis pela extinção das demais espécies humanas, como explica Gabriel. “As evidências indicam que eles tiveram alguma participação na extinção dos neandertais. Não necessariamente de maneira agressiva, mas provavelmente na competição por alimentos, ocupando os mesmos espaços e atrapalhando um pouco a vida deles”.
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Maria Helena Senger |
Segundo Letícia Valota, outros fatores podem ter levado ao desaparecimento dessas populações, em um período de muita instabilidade climática. “Os neandertais coexistiram com os Homo sapiens durante muito tempo, mas viviam em grupos muito diferentes, que tendiam a ser um pouco menores em número de indivíduos [quando comparados aos grupos dos sapiens]”.
Achados recentes mostram que diversas espécies humanas coexistiram há 100 mil anos, como o Homo naledi, localizado na África do Sul em 2017, e o Homo luzonensis nas Filipinas em 2019 e diversas espécies na China. Essas evidências aumentam o nosso conhecimento sobre as antigas populações humanas e enriquecem as ferramentas para determinar as idades e as origens dos ancestrais humanos.
Um grande banco de dados com a descrição das características das espécies hominínias durante os 7 milhões de anos de evolução humana será disponibilizado pelo grupo de pesquisa em alguns meses. “Até então, todas essas medidas estavam perdidas em diversos artigos”, justifica Maria, responsável pelos dados sobre mandíbulas, já trabalhadas pelo grupo em outro artigo.