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Propostas para educação abrem ciclo sobre desafios do próximo governo

por Mauro Bellesa - publicado 04/09/2018 09:10 - última modificação 11/06/2020 06:01

Educação foi o tema do primeiro debate do ciclo "Eleições 2018: Propostas para o Brasil", realizado no dia 31 de agosto, com a participação de José Goldemberg, Maurício Holanda e Nílson José Machado (moderador).
José Goldemberg, Nílson José Machado e Maurício Holanda Maia - 31/8/2018
Seminário com (a partir da esq.) José Goldemberg, Nílson José Machado (moderador) e Maurício Holanda Maia foi o primeiro do ciclo "Eleições 2018: Propostas para o Brasil"

Tornou-se senso comum há anos que a melhoria do sistema de ensino básico (fundamental e médio) público é fator essencial para o desenvolvimento do país e para que a sociedade brasileira torne-se mais justa e desfrute de melhores condições de vida. No entanto, e sem desconsiderar várias iniciativas de sucesso implantadas ao longo dos anos, as carências do sistema ainda são muitas, apesar de inúmeros documentos produzidos pelo governo, percentual do PIB (Produto Interno Bruto) aplicado na educação, ampliação do acesso à escola e outras medidas.

Como os anteriores, o governo a tomar posse no dia 1º de janeiro iniciará seus trabalhos tendo no horizonte a educação como uma das principais preocupações dos brasileiros, ao lado da saúde, emprego, segurança pública e moradia, entre outras prioridades. Foi por isso que o tema foi um dos escolhidos pelo IEA para o ciclo Eleições 2018: Propostas para o Brasil, inaugurado com encontro no dia 31 de agosto com seminário justamente sobre a educação básica pública.

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Os expositores foram o físico José Goldemberg, atual presidente da Fapesp e ex-ministro da Educação e ex-reitor da USP, e Maurício Holanda Maia, ex-secretário da Educação da cidade de Sobral, no Ceará, e atual secretário adjunto de Educação daquele estado. Criação de um projeto nacional de educação, reformulação do ensino fundamental 2 (6º ao 9º ano), alocação de recursos de acordo com o desempenho educacional dos municípios implantação de carreira para os professores e aperfeiçoamento dos sistemas de avaliação e aperfeiçoamento  foram algumas das propostas discutidas nas exposições e no debate com o público presente e online.

Estado de São Paulo

Goldemberg concentrou sua fala nas características e dificuldades do ensino básico público de responsabilidade do governo do estado de São Paulo. Segundo ele, o orçamento anual do estado para a educação tem se mantido relativamente constante nos últimos 15 anos, em torno de R$ 20 bilhões, para uma média de 220 mil professores, dos quais 70 mil estão fora da sala de aula, em funções administrativas ou licenças médicas. "No entanto, nesse período, o número de alunos caiu de 5 para 2 milhões, sendo que o custo atual por aluno está em R$ 7 mil e há uma relação de um professor para cada 10 alunos."

O gasto do sistema corresponde a 6% do PIB do estado, um percentual correspondente à média internacional de países ricos, comentou. "Os professores ganham mal, cerca de metade do que recebe um profissional com o mesmo nível de formação na iniciativa privada." No entanto, a remuneração média de R$ 3.500 é a possível, segundo ele, em função do percentual do PIB já investido.

Melhoria da eficiência

De acordo com Goldemberg, países como Peru, Colômbia, Chile e México pagam o dobro aos professores e o gasto por aluno é o dobro ou o triplo do dispendido com um estudante paulista. Como, em sua opinião, é inviável dobrar o salário dos professores, "a solução está em aumentar o PIB ou melhorar a eficiência do sistema".

José Goldemberg - 31/8/2018
José Goldemberg: "Alternativa é a melhoria da eficiência"

Um aumento significativo do PIB é o desejável, mas também é inviável, disse físico. "Seria preciso verificar como melhorar a eficiência do sistema". No entanto, a opção de diminuir o número de professores diante da redução do número de alunos também é problemática, "pois no Brasil é impossível reduzir o número de servidores públicos".

Diante desse quadro, Goldemberg propõe algumas medidas para melhoria da eficiência. Uma delas é aumentar os salários 5.500 diretores de escolas da rede estadual (como estímulo a uma melhor gestão), melhoria das instalações, um sistema efetivo de avaliação de desempenho ("não apenas um 'provinha'; no Chile, até filmam uma aula do professor para avaliá-lo") e implantação de uma carreira do magistério.

Fundamental 2

Mauricio Holanda Maia considera que deve ser dada prioridade ao fundamental 2 (6º ao 9º ano), pelos impactos que isso pode causar no desempenho dos estudantes no ensino médio, inclusive para que possam aspirar o ingresso num curso superior. "As dificuldades possuem raízes mais socioculturais e psicológicas do que pedagógicas."

Falando sobre a experiência em Sobral e a ampliação de muitas iniciativas para o plano estadual, ele defendeu que a transformação deve ter como princípio uma melhor articulação entre os três níveis governamentais - municipal, estadual e federal - para que todas as crianças estejam alfabetizadas aos sete anos de idade e haja ensino em tempo integral no fundamental 2.

Como o governo federal responde por apenas 0,6% do ensino básico, Maia considera que Brasília "deveria parar de meter o bedelho como faz, procurando implantar medidas centralizadas a partir da média do país e se preocupar em apoiar os sistemas municipal e estadual".

Agora há escolas e os alunos não aprendem: "Fica pensar que o problema é dos meninos". Outro problema são os modelos de apoio: "São paternalistas, o que torna bom um bom negócio para os maus gestores que a situação continue ruim".As avaliações indicam, segundo ele, que 56% das crianças brasileiras com oito anos ou mais são incapazes de ler fluentemente e 20% são incapazes de ler totalmente. "Nordeste, 70% das crianças apresentam nível insatisfatório. Estamos produzindo analfabetos escolarizados."

Maurício Holanda Maia / 31/8/2018
Maurício Holanda Maia: "Estamos produzindo analfabetos escolarizados"

Aspirações

Ele defendeu política intersetoriais para o desenvolvimento na primeira infância, inclusive com visitas domiciliares. No caso dos adolescentes, as políticas devem abrir espaço para o protagonismo dos jovens, estimulando o aprendizado em empresas e o acesso ao ensino superior. "Eles têm todo o direito da aspirar ao ensino superior. Nossa visão é elitista. Não queremos baixar o nível de ensino e acabamos não atingindo esses jovens. Muitos vão estudar medicina ou fazer pós-graduação no Paraguai."

Maia é cético em relação ao impacto que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) poderá ter em sala de aula. Para ele, é impossível fazer uma reforma que não respeite o professor e sua ética. "É preciso concertação, respeito às aspirações dos profissionais e pactos de responsabilidade mútua e estratégias de médio e longo prazo."

Uma de suas propostas é que os professores com pós-graduação sejam autorizados a oferecer cursos aos outros professores e que este possam valer créditos para estudos na universidade. Do ponto de vista de financiamento, ele afirmou que o avanço na educação cearense se deve também a um sistema que vincula a parte do ICMS que cada município recebe aos resultados obtidos na educação.

Nílson José Machado - 31/8/2018
Nílson José Macahdo: "Falta um projeto nacional de educação"

Em complemento a tudo isso, Maia defende defende que a banda larga de internet se torne universal. No entanto, a preocupação primordial não deve ser puramente didática, mas sim tornar a internet um componente do ambiente cultural dos jovens. "Evidentemente, ela pode ser um recurso didático do professor ou mesmo para o aprendizado autogerenciado pelo estudante."

Colaboração

Para Nílson José Machado, moderador do debate e coordenador do Grupo de Estudos Educação Básica Pública Brasileira: Dificuldades Aparentes, Desafios Reais, a educação brasileira "tem muito planejamento e muita avaliação, mas falta um projeto nacional". Ele defendeu colaboração entre governos estaduais e municipais, universidades e organizações não governamentais, com a mescla inclusive de experiências realizadas no ensino privado.

Sobram documentos, mas as bases curriculares estaduais foram ignoradas na elaboração da BNCC, afirmou. "Não se pode ter um plano com 1.500 páginas e centenas de habilidades que o aluno tem de adquirir. O Canadá fez uma reforma na educação nos anos 90 baseada num documento com 50 páginas."

Machado julga importante que seja estimulada a autorregulamentação profissional dos professores: "A tentativa de negociação com sindicatos tem sido desastrosa".